sábado, setembro 09, 2006

Um copo para o caminho

Estávamos embriagados. Os copos manchados do vermelho ocre do vinho não nos deixavam mentir. As nossa faces também não deixavam muita margem para dúvidas. E, no entanto, as palavras que dizíamos um ao outro eram as mais verdadeiras que tínhamos dito desde que nos conhecíamos. Tinham sido 8 meses de embriaguez que agora terminavam, ironia das ironias, com uma garrafa quase vazia no chão e com os nossos corpos nus deitados no mesmo chão. Mas desta vez era diferente. Desta vez não eram os nossos lábios que se procuravam, nem os nossos corpos que ansiavam um pelo outro. Era a hora da despedida. A hora de confirmarmos um ao outro que as nossas vidas teriam de continuar em separado. O que nos unia não era amor mas sim a falta de algo. A falta daqueles que tínhamos deixado para trás para nos lançarmos numa experiência de vida diferente. A vida como a tínhamos conhecido nos últimos meses de carícias, beijos, paixão, comunhão e dependência estava prestes a mudar. Tínhamos de confessar um ao outro que não era amor. Que não chegava para partirmos lado a lado para um dos destinos que esperavam por nós. Eu estava de partida no dia seguinte, tu ainda ias ficar naquela cidade por mais uns meses. Não havia lágrimas mas uma certa tristeza imperava nas nossas palavras. Tínhamos sido amigos, amantes, irmãos, no centro de um turbilhão de emoções que se esgotava ali. Os nossos olhos não conseguiam cruzar-se, talvez tenha sido por isso que o vinho correu pelas nossas gargantas de forma ainda mais rápida. Tínhamos urgência em ficar ébrios, em ganhar a coragem que nos faltava, para nos confrontarmos com a realidade que nos esperava por trás do nascer do sol. Abraçamo-nos. Ficámos assim, abraçados no chão, esperando que o tempo parasse e ficássemos assim eternamente. As coisas estranhas que o vinho nos faz. Por entre as frestas da persiana, começou a entrar alguma luz. Tinha sido uma noite em claro. A tentar memorizar os detalhes do teu corpo, da tua boca, dos teus olhos. A beber ao máximo do suor que corria pelos nossos corpos. A fazer um esforço para não me esquecer do cheiro da tua pele branca e dos teus cabelos ruivos. Desejando que tivéssemos mais uma noite, que ao mesmo tempo saberia que nunca mais havia de vir. Ainda atravessas os meus pensamentos, de vez em quando. A eterna questão do "e se?". Mas depois rapidamente esqueço isso, pois sei que o que tivémos teve o seu tempo e o seu espaço, e há-de ficar sempre como uma memória há qual vai saber sempre bem voltar. Tal como o mesmo vinho que bebemos nessa noite, e do qual gosto de beber um copo de vez em quando.

I will never forget you, you know that, don't you?

1 comentário:

Sofia Viseu disse...

não há guronsan que faça esquecer uma despedida dessas. muito intenso...