terça-feira, outubro 10, 2006

O arrepio nuclear

Corria o mês de Abril de 2000 e eu encontrava-me neste local.


Esta é uma foto da fronteira entre a República da Coreia (do Sul) e a República Democrática Popular da Coreia (do Norte), o muito tristemente célebre Paralelo 38 ou, se preferirem, a Zona Dismilitarizada (DMZ). Trata-se de uma faixa de terreno completamente desprovida de civis, com uma das maiores concentrações de forças militares por m2 no mundo, e com um ar no qual se podia perfeitamente respirar o cheiro a pólvora ou estilhaços.

Lembro-me de na altura ficar muito impressionado com todo o arame farpado, os soldados em contínua vigilância, a propaganda que era espalhada por todos os cantos e por ambos os lados da barricada, por todos os vestígios da Guerra da Coreia que por ali se encontravam espalhados e pela devastação de quase toda aquela área, quase cinquenta anos depois do conflito. Na altura, e já dois meses depois de estar a viver em Seul, fiquei com a certeza absoluta que ali, naquela faixa de terreno, a Guerra Fria ainda estava bem viva e por isso senti um arrepio na espinha, por viver tão perto de uma situação como aquela.

Isto tudo antes do W. anunciar ao mundo os verdadeiros demónios que ameaçavam a nossa liberdade (obviamente que se esqueceu da sua parte interveniente nos eventos que se sucederiam nos anos seguintes). A Coreia do Norte fazia assim parte da elite maléfica. E já na altura se comentava as suas investidas no campo do armamento nuclear. Mas, como o sucessor do Grande Timoneiro era apresentado como esquisito, cómico e mesmo louco, a Coreia do Norte ficava relegada para a segunda divisão de honra, cabendo as honras da primeira liga ao Afeganistão, Iraque e Irão. As aproximações do regime de Kim Jong-Il ao governo sul-coreano durante os primeiros anos do novo milénio, nomeadamente no que tocava às reuniões de famílias separadas pela guerra e pela DMZ, também ajudaram a pensar que ainda havia esperança para salvar quer a Coreia do Norte quer o seu cada vez mais esfomeado povo das garras do demo. Puro engano. Mesmo loucos como Kim Jong-Il conseguem ser maquinalmente frios e eis que, no ano de 2006, vivemos mais uma vez com o fantasma de Hiroxima e Nagazaki sobre as nossas cabeças. Sim, as nossas cabeças, pois mesmo estando a milhares de quilómetros de distância, devemos sentirmo-nos ameaçados.

Se no Afeganistão haviam os talibãs e o Bin Laden escondido, se no Iraque havia resmas de armas de destruição maciça (ou assim nos quiseram fazer entender... não, não vou iniciar nenhuma teoria da conspiração...), então urge intervir de algum modo na Coreia "democrática" e "popular" de Jong-Il. Pela não proliferação do nuclear neste planeta. Pela salvação de grande parte do povo norte-coreano, que passa fome extrema (havendo mesmo relatórios de canibalismo) para que o Exército seja um dos mais bem preparados do globo. Para que um ditadordezo de meia tijela não se fique a rir por detrás das cortinas dos edifícios megalómanos de Pyongyang. E porque ninguém merece viver sob a ameaça da sua existência ser terminada em décimas de segundo.

E sim, esta questão é pessoal. Tenho receio pelos meus amigos que deixei na Coreia. Eles não merecem nem têm culpa desta "guerra" interesseira e hipócrita.

3 comentários:

Patrícia disse...

Se até quem não tem ninguém que ame lá, teme por todas as vidas que sofrem horrores, imagino quem lá tem um pedacinho do coração... :(

Nuno Guronsan disse...

Custa, custa muito não poder estar ao pé deles e delas. Mas ainda bem que existe o e-mail, o telefone, o messenger, que nestas alturas fazem a ligação com o outro lado do globo.

Obrigado pela visita, Patricia. Beijos.

Patrícia disse...

:)

Beijos, Nuno