quarta-feira, abril 30, 2008
Mestre de si próprio
Igor mudou de vida. Cortou o cabelo, passou a usar óculos e usa roupas modernas e que quase conseguem disfarçar as suas deformidades físicas. Igor arranjou um trabalho normal, serve às mesas, tira cafés e vai atendendo clientes e mais clientes, sem pensar nos seus límbicos, reptilianos ou cortexes. Igor quase começa a perceber o que é a felicidade. E pensar que apenas bastava mudar-se para os subúrbios.
Ah, e Igor já não arrasta a sua perna direita. O que é bom para o negócio.
terça-feira, abril 29, 2008
more human than human
Ontem foi dia de recuperar as visões apocalípticas de uma Los Angeles do futuro. Uma Los Angeles sombria, escura e fria, onde a chuva nunca pára de cair. Onde o céu apenas é iluminado por explosões de fogo e ecrãns gigantescos de publicidade enebriante. Onde não há pessoas boas nem pessoas más, apenas sobreviventes, sejam eles humanos ou replicantes. Onde palavras como consciência ou humanidade ou emoções são questionadas a cada minuto de filme e já não sabemos muito bem quem é feito de carne e osso e quem é feito de fios e parafusos. Onde ficamos hipnotizados pelos sons e pelas imagens, tantas e tantas vezes vistas, mas que na grande tela adquirem um impacto que nos deixa sem respiração. Afinal de contas, será mesmo este o verdadeiro vislumbre do que o nosso futuro poderá vir a ser? Quem sabe. Uma coisa será certa, no nosso presente já há lugares tão assustadores como os que Blade Runner nos obriga a ver...
domingo, abril 27, 2008
Do vazio - II
Senti o mesmo.
Pensei em escrever sobre isso tal como tu.
De forma subtil e quase estranha, lá as coisas tornaram-se mais reais, não porque tenha descoberto horrores ou contornos da história que não conhecia, mas porque os números ganharam rosto.
Um rosto que não era nem de um actor num filme, nem estava numa fotografia de um livro.
Como se as telas e letras, ali, tivessem uma essência especial que se infiltrava na alma.
O que vi nos museus e memoriais que visitámos, desdobrou a História em várias histórias, várias famílias, em pessoas.
Tocou-me de um forma suave e ao mesmo tempo quase esmagadora.
Já chorei a ver documentários sobre o Nazismo e até mesmo sobre o muro de Berlim.
Curiosamente lá não chorei. Talvez porque inconscientemente me tenha apercebido que não tinha direito a sofrer por dores que não eram realmente minhas.
No meio disto tudo gostei também de recordar, que mesmo na escuridão e alheamento há sempre quem lute, quem se recuse a ir com a maré e ajude os outros mesmo correndo risco de vida.
bjs
RF
E porque as tuas palavras ecoaram cá dentro, com a mesma ressonância que aquelas que ouvi, li e vi nos últimos dias, aqui as deixo, minha querida amiga, como humilde forma de agradecimento.
sábado, abril 26, 2008
sexta-feira, abril 25, 2008
Do vazio.
sábado, abril 19, 2008
A noite abre meus olhos
uma parcela trémula
um silêncio demasiado precioso
para a listagem das grandes transformações
Caminhei sempre para ti sobre o mar encrespado
na constelação onde os tremoceiros estendem
rondas de aço e charcos
no seu extremo azulado
Ferrugens cintilam no mundo,
atravessei a corrente
unicamente às escuras
construí minha casa na duração
de obscuras línguas de fogo, de lianas, de líquens
A aurora para a qual todos se voltam
leva meu barco da porta entreaberta
o amor é uma noite a que se chega só"
Cordon bleu
sexta-feira, abril 18, 2008
quinta-feira, abril 17, 2008
Oração oferecida
quarta-feira, abril 16, 2008
último sopro
Ou como às vezes os jogos deviam terminar ao intervalo.
segunda-feira, abril 14, 2008
domingo, abril 13, 2008
Prenda
Os teus muitos anos quase me parecem equivaler a duas vidas. É certo que não me farto de escutar as tuas histórias, uma e outra vez, sobre lagares, videiras, campos cultivados a perder de vista, ou como costumavas surripiar uma ou outra maçã do quintal da bisavó Beatriz. Serão mesmo essas as minhas preferidas, de quando não terias mais que doze ou treze anos, a correr de um lado para o outro da aldeia. Fico fascinado. Podes não te lembrar do que fizémos ontem de manhã, mas ainda te lembras de peripécias que aconteceram há quase oitenta anos atrás. Quando o ar que respiravas era de outro tipo. Quando a garganta não te doía e ainda se ouvia a tua voz forte, no centro do coro paroquial. Quando os teus risos ainda não eram feitos de sussurros. Desde sempre que me lembro de chegar à aldeia e, ainda longe da porta da casa da estrada, já conseguir vislumbrar os teus cabelos brancos, com o vento a dançar à sua volta, enfeitiçado. Gostava do teu calor quando me abraçavas. Hoje gosto do teu sorriso de cada vez que me meto contigo. Gosto menos das lágrimas que vais derramando de vez em quando. Sei que na maior parte das vezes é mais forte que tu e que não as consegues impedir, mas não deixo de ficar triste por ver que o tempo finalmente te está a apanhar. Quando apenas dava pela tua cintura, pensava, ou melhor sonhava acordado, como muitas vezes o fazia, que ias viver para sempre, que estarias sempre ali, à distância da minha mão no centro da tua, enquanto percorríamos as estradas da aldeia. Mesmo quando passei a ter que falar um bocadinho mais alto, para que ouvisses bem os meus carinhos, e por vezes as minhas afrontas próprias de quem era jovem e ainda pensava que era o rebelde da família, mesmo nessa altura não duvidava que serias eterno, como as oliveiras que tantas vezes afagámos com as nossas mãos gretadas depois de mais um dia gelado a apanhar azeitonas do chão. Vejo agora, nestes dias em que estás ao pé de mim e voltaste a fazer parte da minha rotina diária, que assim não será. Que tenho de agarrar com as duas mãos todos os segundos que passamos juntos, todos os passeios que damos, todas as palavras que partilhamos e os risos que fazemos ecoar por todas as divisões da casa. Que não vais viver para sempre mas que viveste uma vida que eu apenas posso desejar igualar, em circunstâncias diferentes é certo, mas, em parte, da mesma forma como viveste a tua, sem nunca virar a cara às dificuldades e obstáculos que se foram colocando à tua frente. Às vezes, fazes um elogio sobre mim, à mesa do almoço. Nessas alturas, e tu sabes disso, é como se ficasse a pairar no céu, com essa oferenda que só tu me podes oferecer, mais valiosa que qualquer prémio de desempenho sacado sabe-se lá a que custo, mais inspiradora que uma plateia repleta no atlântico. É como se enchesses o meu coração com uma felicidade que muito poucas pessoas me podem dar, assim, sem esperar retribuição. Que a tento dar-te sempre que estamos juntos, na forma de uma palavra, de um beijo ou de um abraço. E que sempre me sabe a tão pouco, depois de todos estes anos de caminhada em conjunto.
És grande, meu querido avô.
sábado, abril 12, 2008
Arquivo
Hoje já mencionei, falei, escrevi a palavra saudade umas dez vezes.
Serei eu um saudosista vertebrado e inconsequente?
Há quem me acuse de não passar de um amigo de Alex.
Há quem partilhe comigo toda uma série de coisas que gostámos de viver e que, de vez em quando, gostamos de recordar.
Mas hoje apenas me limitei a lembrar um passado não muito distante.
E de como as coisas rapidamente mudam, com a velocidade de um tornado.
E o que ontem nos ocupava horas sem fim, de puro deleite, hoje parecem fazer parte de um album de fotografias a preto e branco, que apenas nos lembramos de abrir quando estamos sozinhos ou na companhia de pessoas que também já quase tínhamos esquecido.
E depois sentimos um arrepio, ou um aperto no peito.
Porque reviver esses ínfimos momentos acaba por doer ainda mais do que a altura em que os vivemos.
E é impossível não ter saudades de alguns desses apertos de peito.
Por mais que nos tentemos travar.
sexta-feira, abril 11, 2008
Cortes
It's with great regret that I have to tell all of you that Beirut is canceling their summer European shows. My reasons for doing this are many, a lot of them personal, but I still feel I need to provide something of an explanation.
The past two years have been a mindblowing experience. From the first indications that people were putting songs from Gulag up on their blogs to our incredible tour of Australia and New Zealand that we just completed, everything that has happened has been beyond anything I'd ever hoped could happen with the music I wrote and recorded in my bedroom. Once things started happening, I decided I wanted to do everything as big as possible. So, I set about putting together a large band, and giving that band a huge sound, and making the most spectacular records we possibly could.
I know this can sound like an artist shithead kind of comment, but going through all that really does have its low points along with the highs. The responsibilities of gathering people around your vision, working with great people like those who work directly for the band and those at the label, wanting to insure that every show is as good as humanly possible so that every single person in the audience sees that we put in a real effort, all of that leads to a lot of issues in terms of doing right by people who have done you right.
It's come time to change some things, reinvent some others, and come back at some point with a fresh perspective and batch of songs.
Please accept my apologies. I promise we'll be back, in some form.
-Zach
Na volta.
Ela apareceu logo pela manhã. Não a vi quando me levantei e espreitei pela janela, para ver se a chuva já tinha fugido para outro país. O sol já começava a dar um ar da sua graça e assim a vontade para sair de casa até ganhou outro ímpeto. Mas assim que coloquei um pé na calçada, lá estava ela. Negra, grande e prestes a desabar em cima de mim. Corri para o carro, com receio da tormenta que se adivinhava, mas estranhamente nada aconteceu. Rodei a chave e entrei em modo de piloto automático, como acontece em quase todas as manhãs. Mas sentia uma presença estranha à minha volta. A nuvem ali continuava, a pairar sobre mim e cada vez mais negra, em antecipação de tempestade. Mas a chuva continuava a não aparecer e o escritório já estava à vista.
O resto do dia passou num piscar de olhos.
Não tinha pensado nela durante todo o dia, mas tinha a sensação que rapidamente me lembraria dela quando voltasse à rua. E assim foi, ela continuava no céu sobre a minha cabeça, à minha espera, ou assim parecia. Por entre fiapos de nuvens pequeninas, o sol continuava a iluminar o solo, mas eu apenas tinha olhos para aquela estranha companhia. A nuvem permanecia a seguir-me, sem largar uma única gota de chuva. Parado no trânsito, tentava captar todos os detalhes daquela massa de ar ameaçadora, apenas para constatar que, a cada detalhe que observava mais atentamente, mais familiar ela me parecia. Havia algo de mim naquela nuvem, apenas não conseguia explicar porquê. Ela fazia parte de mim ou eu fazia parte dela? De alguma forma os nossos destinos pareciam caminhar pelas mesmas estradas. Rumando a casa, com o sol a bater nas nossas costas.
Agora é noite. Será que amanhã estarás à minha espera?
Espírito olímpico?
quinta-feira, abril 10, 2008
Ainda há esperança
Isto é a verdade que eu sempre quis escrever e nunca o consegui, em dois anos e meio de blogue. Obrigado, meu caro, as tuas palavras são para mim um bálsamo. Enorme vénia.
quarta-feira, abril 09, 2008
segunda-feira, abril 07, 2008
Epílogo
Que foram horas e mais horas desperdiçadas voluntariamente, para um fim que nunca é muito claro e que visa apenas impressionar barrigas opulentas e que já há muito entraram em modo automático. E a conclusão óbvia é que o Darwin podia meter as suas teorias de evolução num sítio de uma pessoa que eu cá sei.
O que ainda vai balançando a coisa são as histórias e os breves momentos de pura amizade que saem reforçadas e que vão ajudando cada passo que damos ali dentro.
Emoldure-se e pendure-se!
sábado, abril 05, 2008
Ar
sexta-feira, abril 04, 2008
Não são só palavras
E foi preciso ler as palavras de outra pessoa, de quem muito gosto, para me aperceber do que realmente se esconde por detrás de uma expressão como não estou aí.
De como o cansaço pode ser uma mera máscara para as batalhas diárias que se perdem.
De como o passado, o presente e o futuro de uma vida não dependem, pura e unicamente, dessa mesma vida. Ou como podem haver desculpas tão medíocres.
E por isso, e por muito pouco que possa significar, peço desculpa. Um pedido a uma série de pessoas que provavelmente nunca vão chegar a ler estas palavras. Mas mesmo assim acho que o tinha que fazer. Aliás, acho que hoje não ia conseguir ficar em aparente paz comigo próprio se o não fizesse. Por isso volto a repetir, desculpem-me.
E o que me salva é que amanhã há um novo dia e uma nova batalha.
E mais uma oportunidade.
quarta-feira, abril 02, 2008
The Bird
Fast forward to 1999. I was lying in intensive care when I felt a presence in the room. I opened my eyes ans there stood Merle Haggard silently studying me. He bent down, put his hand behind my head, rubbed his forehead against mine and said «you're gonna be alright, Cash». And I am. Thanks for the return visit, Hag."
March, 2000