domingo, novembro 30, 2008
Dia Supremo
Polaroides - V
Tu não estás nesta polaroide, mas eu estou. E a mesma é do tempo que ontem recordámos, com muita saudade, perceptível mesmo para além das nossas palavras. A conversa foi longa, mais longa que a noite e que o mar revolto que estava lá fora. As palavras que partilhámos foram a nossa fogueira, que nos aqueceu à volta de uma série de coisas, passadas e presentes (e mesmo futuras) que quisémos dizer um ao outro, que tínhamos urgência em dizer para que de alguma forma destapássemos o hiato que surgiu, lentamente, entre as nossas vidas. Fálamos de amores, amizades, encontros e desencontros, da mente e dos seus meandros, daquilo que fizémos, daquilo que ansiamos fazer, da memória e da falta da mesma. Do secundário, claro, os dias de outra vida onde fomos felizes, despreocupados e, de certa forma, mais idealistas. Não voltámos assim tanto no tempo que nos apetecesse ficar por lá, apenas puxámos os fios dos novelos da memória, lembrando coisas e eventos dos quais já não nos lembrávamos. Das festas de garagem, de outras "festas" e "bolinhos", do café dos pretos, do "presuntinho", das músicas que nos uniram, de todos ou quase todos os nossos colegas e da forma como os víamos e os vemos agora, das conversas intermináveis na parte de trás do autocarro, dos espirros, dos apalpanços, das faltas a vermelho e colectivas, dos profs com um parafuso a menos, de como tudo aquilo nos ajudou a crescer e, quase com toda a certeza, ajudou a formar parte do puzzle que somos hoje em dia. E a certa altura parecia que o tempo não tinha passado. Que apenas faltavam os cadernos em cima da mesa, os maços de tabaco e as cassetes gravadas clandestinamente. E foi bom. Ver-te e conhecer-te, outra vez. E desejar que ainda percorramos muito caminho juntos. Eu gostei, e tu, senhora doutora, será que também gostaste?
Puñal
entra en el corazón,
como la reja del arado
en el yermo.
No.
No me lo claves.
No.
El puñal,
como un rayo de sol,
incendia las terribles
hondonadas.
No.
No me lo claves.
No."

Tardes frias e cinzentas devem passar-se com pessoas ao lado. Ainda que sejam desconhecidas e quase todas falem uma língua que não seja a nossa. Porque, às vezes, esse é todo o calor que precisamos para nos sentirmos parte de um mundo que teima em auto-destruir-se lentamente. E no meio de tanta gente diferente e anónima, que se congrega num espaço que gostam em comum, acaba por ser uma espécie de lareira à volta da qual todos nos podemos reunir, ler os nossos livros num sofá de muitas gerações, sorrir com as brincadeiras das crianças que correm à volta da árvore, e ouvir estórias de vidas que andam ali, ao nosso lado, na rua.
quinta-feira, novembro 27, 2008
quarta-feira, novembro 26, 2008
Diplomas...
E se pudéssemos ter à nossa frente um possível futuro "eu", um "eu" de uma dimensão alternativa cuja curva no tempo nos tivesse tornado um ser humano amargurado e desiludido com as escolhas que tinha tomado durante o processo de amadurecimento? E se esse nosso futuro "eu" nos pudesse, de alguma forma, voltar a por-nos nos carris para uma vida memorável, preservando tudo o que a nossa pequena vida éfemera realmente devia significar?
E se tudo isso acontecesse num único verão?
E se de alguma estranha e quase perversa maneira, ficção e realidade se pudessem encontrar numa esquina, num minúsculo ponto do nosso espaço, numa altura de todo inesperada, mas perfeitamente desejada?
Talvez fosse a altura certa para recorrer a um profissional da mente...
(smile)
The Wackness
"So that was all bullshit right? All that stuff about embracing your pain, making it a part of you? You can't do this, you can't just give up. Life is hard and it's full of pain and what-not, but we take it cause there's great stuff too. And we can do it cause we have friends- because we have each other."
terça-feira, novembro 25, 2008
Traboules
Il en existe de plusieurs types :
- traboule directe : on voit la sortie dès l'entrée.
- traboule en angle : traversant deux ou plusieurs bâtiments à l'angle de deux rues.
- traboule rayonnante : une cour au coeur d'un îlot d'habitations comportant plusieurs accès.
- traboules à détours
Certaines comportent des escaliers car elle relient des rues ayant un fort dénivelé, d'autres cumulent ces différentes caractéristiques."
segunda-feira, novembro 24, 2008
Muda
domingo, novembro 23, 2008
Ganesh
sexta-feira, novembro 21, 2008
"All right. We'll call it a draw."
quinta-feira, novembro 20, 2008
Desliga.
Naqueles dias, a melancolia descia pelas paredes, lentamente, e ia abraçá-lo na sua poltrona, assistindo com ele ao desfile televisivo das desgraças e semi-desgraças de mais um dia praticamente finito de Outono. A melancolia envolvia-o como um cobertor enquanto assistia à intransigência de um executivo que clama desesperadamente por uma recauchutagem ou novas eleições, versus uma oposição que consegue melhores resultados quando não abre a boca do que quando larga meia dúzia de bujardas para garantir o seu share televisivo. A melancolia serpenteava à sua volta enquanto ele angustiava por também receber uma carta de alguma herança milionária enviada por um parente cujo nome não passava de iniciais e que normalmente começavam sempre por B e acabavam numa taxa de 16%. A melancolia dizia-lhe pequenos nadas ao ouvido enquanto ele tentava perceber porque razão é que ainda suspeitavam que as gasolineiras não passavam de um cartel quando tinham baixado tão generosamente os preços do seu tão precioso néctar. A melancolia insinuava-se-lhe descaradamente à medida que novos termos de identidade eram emitidos para tão garbosos jovens apenas pelo facto de terem uma linguagem mais colorida para um telejornal do que uma peixeira do bolhão (isso e o facto de atirarem uns tijolos e gostarem de pacotes de açucar um bocadinho maiores e de moagem mais fina). A melancolia infiltrava-se-lhe nos poros enquanto ele achava perfeitamente natural o menino d'oiro ficar tão distraído com tanto calor e tão poucas roupas em quantidades tão desmedidas.
A melancolia arrefeceu-o. Desligou a televisão, foi para a cama e pegou num livro. Um livro sobre um país menos melancólico e menos outonal.
segunda-feira, novembro 17, 2008
As Mulheres do meu Pai
José Eduardo Agualusa
domingo, novembro 09, 2008
Ondas Sonoras - XXXV
Espero que ele compreenda que isto se trata de um elogio. Digo isto pois ambos são contadores de histórias, o meu avô antes de ser meu avô, o JP antes de ser músico. E como contadores de histórias conseguem prender a atenção de todos aqueles que gostam de uma boa história, seja à volta de uma lareira antiga, no caso do meu avô, seja à volta de um palco espartanamente iluminado, no caso do JP. Bastava ver o público, sentado à volta das mesas, a chegar-se à frente para ouvir melhor as histórias de JP e a doçura com que ele debitava cada palavra cujo som parecia vir de tempos imemoriais, facto beneficiado pela estrutura (quase) a solo do concerto.
Ok, se calhar estou a romancear demasiado a coisa e daqui a bocadinho já pareço um artigo do jornal de negócios (privada, eu sei). Bom, digo apenas que o concerto foi bonito, íntimo e de amigos para amigos, mesmo aqueles que são desconhecidos ou estavam ali pela primeira vez. Foram bonitas as cumplicidades entre músicos e entre JP e o público presente. E as histórias de imigração, provas de poder perante a amada, prostituição, conjûges de mãos dadas com dores... de testa, acompanhadas apenas de guitarra acústica, piano e flauta, são realmente deliciosas e por isso valeu mesmo a pena estar ontem à noite, naquele jardim de inverno (estaríam a pensar em ti, Gi?). A repetir.
quarta-feira, novembro 05, 2008
Baixa psicológica.
Um bêbado.
Dois bêbados.
Três bêbados.
Quatro bêbados.
Uma construção que chega até às nuvens.
Uma casa que anda.
Alguns risos, muitas interjeições.
17:31
Um bêbado.
Dois bêbados.
Três bêbados.
Uma lenda de barbas.
Uns quantos risos, com muita mágoa por trás.
A rendição a uma história que tem o fim que merece.
A vontade não concluída de cometer um erro.
Dormir.
A respirar...
Começa a tornar-se uma das consequências mais usuais do Natal (sim, leram bem), a constante falta de tempo para tudo e para todos. Por muito que me custe.
Vou tentar manter os mínimos sinais de vida.
Mr. November
Uma palavra apenas. Esperança.
(Imagem via um amigo que em boa altura decidiu regressar a estes espaços virtuais.)
quarta-feira, outubro 29, 2008
Cavalos nocturnos
Um minuto depois de perder-te."
quarta-feira, outubro 22, 2008
movimento
silêncio, emoção,
de doçura meia,
essa tua palma
sobre a minha mão
o que tem que eu leia?
para lá da floresta
onde as coisas são
sem minha licença,
mais linear que esta
confusa razão
da tua presença
não há outro sim
que não tem dizer
e explica melhor?
qualquer coisa assim
como um tempo sem fim
como um espaço sem tempo"
terça-feira, outubro 21, 2008
Dia bom
"(Para o Espaço Cinzento ou não, como queiras. Pareceu-me que andas sem inspiração, e assim aproveitei a minha rara de hoje. Apeteceu-me.)
Hoje chove intensamente. Apesar de teres as escovas dianteiras e traseiras a desviar a água dos teus vidros o mais que podem, não consegues ver nada em direcção alguma. Parece que há uma opaca cortina cinzenta que te envolve. No entanto, o teu espelho preferido mostra-te hoje o filme da tua vida. Nele já viste o que se passou à tua volta: o passageiro que ameaçava a condutora, o marido com o cano da pistola virado ao peito da esposa, a senhora que se maquilhava num carro vizinho, as saudades que tinhas dos teus mais próximos, os amigos que se casaram e se divorciaram. Hoje, é a tua vida que está em exibição nesse cinema só teu.
Esse filme de hoje é especial. Não te mostra o que conheces de ti, mostra-te vários filmes ao mesmo tempo, todos sobrepostos, todos paralelos e que começam no preciso momento em que ligas a ignição do carro. Mostra-te os vários desafios que tens pela frente, as possíveis alternativas para cada um deles, as muitas estradas que podes escolher para chegares ao teu destino. Mas não te mostra o destino final e é isso que te preocupa.
O visionamento deixa-te obcecado e esqueces-te que estás ao volante e em poder de uma arma mortífera que não podes negligenciar. Estás desligado da realidade, só vês o teu filme. Nesse instante, uma forte rajada de vento e um trovão abanam o veículo. Até o rádio emudeceu. Acordas do sonho acordado e encostas o carro para te poderes acalmar, para diminuir a adrenalina que corre nas tuas veias. O teu coração bate forte, o sangue corre-te pelas veias a uma velocidade que parece impossível.
Se estivesse sol, se não tivesses esses horários violentos a cumprir, sabias que te poderias refugiar no teu bar-esplanada favorito à beira mar, fizesse calor ou não, desde que houvesse um raio de sol para te aquecer a alma e um bom livro para te alimentar a imaginação. Se. Mas não, continuava a chover intensamente e pelos vidros não vias nada por muito que te esforçasses. Só o espelho continuava a exibir o teu filme. Assim ficaste ao longo de minutos, horas, ou mesmo dias? Não sabias se já estavas em condições de continuar a tua viagem ou se deverias continuar na berma, à espera, em quase eterna pausa para continuar. Apenas sentias esses suores frios provocados pelos calafrios e ansiedades.
Enquanto estás parado, não consegues tirar o olhar do espelho. Os actores principais já entraram em muitos castings, já os conheces de outros filmes antigos. Mas a meada da história parece não te fazer sentido algum: partes da história já metem sangue, gumes afiados de canivetes de barbeiro, lava intensa a correr pelos sucalcos do teu país e que o transformam em terra eternamente queimada e infértil, lutas fúteis com torrentes de água gélida muitas vezes mais fortes que tu. Que sentido faz isto tudo? Ainda por cima não tens comando para desligar o teu televisor privado, quanto mais para fazer rewind ou fast forward. O cinto de segurança prende-te ao assento, a tempestade aprisiona-te no teu veículo. É sufocante e já nem sabes o que podes sentir. Mas ris-te no teu silêncio.
Bruscamente acordas do transe, todo transpirado e ofegante pelo que acabas de viver. Afinal foi apenas e só um sonho. Um sonho que pareceu realidade, um sonho que durou toda a noite, uma noite que pareceu infindável. Mas nada é eterno, sabes isso. E olhas pela janela. Está um sol radiante, um azul de céu que faz lembrar o mar calmo, uma brisa fresca que convida a passear à beira mar. E decides pegar no teu carro, sem medos de filmes, sem medos de espelhos, e vais para o teu bar-esplanada favorito com um livro na mão e boa música no ar. E sorris.
Sorris, porque reconheces ao longe, neste dia especial, o The Happy Birthday Song contido na misteriosa produção de ovos do André Pássaro. Haja muitos mais dias assim."