quarta-feira, novembro 25, 2015

triste

Invariavelmente, num dia como o de hoje, é impossível não pensar em algo que não seja a mortalidade das coisas. Como, de uma maneira ou de outra, tudo o que nos rodeia seja finito, tenha os dias contados. Pode demorar uns minutos, alguns dias, muitos anos, décadas, mesmo séculos, mas nada impede o avançar do tempo e o aproximar do fim inevitável. E é este o pensamento que me atravessa quando recebo uma notícia tão triste como a de hoje. Por muito que tente afastá-lo da minha mente, tal qual um parasita que se instala, todas as imagens, todas as sinápses vão dar ao mesmo. Tento distrair-me, ler um livro, ouvir música, sair para a rua e caminhar sem destino, mas a minha alma continua a ser invadida por imagens agora agridoces, perdidas no tempo e com todo um novo significado. Recordações de quando nos conhecemos, da alegria da nossa amizade, dos momentos bons que passámos e que ficaram registados em fotografias de papel mate, dos momentos menos bons que passámos, das pessoas que amámos e que nos deixaram, das pessoas que continuamos a amar e que vimos quase à beira do abismo, de como ainda nos mantínhamos em contacto mesmo se a vida decidiu afastar-nos um pouco nesta grande bola azul a que chamamos Terra. Todas essas recordações regressam agora aos meus olhos, que ficam turvos perante a forma como tudo acabou. A morte é algo que já não me assusta, já passei por muita coisa, muita dor, muita tristeza, mas há um sentimento de aceitação que agora existe em mim, o tal fim anunciado ao qual nenhum de nós consegue fugir. Isso está há muito cá dentro. Agora, a forma como tal acontece e o momento, isso sim continua a deixar-me perdido, abandonado no meio de um terrível labirinto que teima em manter-me fechado claustrofobicamente. E é assim que hoje que me sinto, com dificuldade em respirar, com dificuldade em ver a luz, mesmo com o sol a brilhar intensamente, com muita dificuldade em compreender a razão que possa haver por trás de semelhante tragédia. Gostava de tentar perceber mais o ser humano e a sua consciência. Gostava de perceber os seus meandros, os seus cantos mais escuros. Gostava de tentar arranjar algum sentido para aquilo que aqui andamos a fazer. Se realmente valeu a pena a evolução fantástica do ser humano. Se pode haver algo que equilibre os sentimentos de dor, de angústia, de ausência, de tristeza. Se a memória vai realmente perdurar, ou se daqui a um ano a nossa mente já virou a esquina, e são poucas ou nenhumas as gavetas que dispensou para aquilo que sinto hoje. Gostava tanto de saber tudo isto e muito mais. Mas também sei que trocava todos estes desejos de bom grado, se isso significasse não ter recebido aquele telefonema, se isso significasse que ainda estavas aqui, connosco, junto das pessoas que te amavam e que te queriam tanto bem. Se ao menos a vida fosse regida por estes sentimentos, poderia ser que, ao menos por um breve instante, a vida fosse realmente iluminada, assim como tu a iluminaste para quem te conheceu. Que a tua alma esteja feliz. Que a tua alma seja o raio de sol que entra neste preciso momento pela janela, enquanto escrevo estas palavras e algumas lágrimas correm pela minha face.


segunda-feira, novembro 09, 2015

De uma beleza imensa.



Por mim partia outra vez para lá já amanhã.
E, fica a prova, é mesmo na Terra e não na Lua.


quinta-feira, outubro 08, 2015

A Noite e a Madrugada

    "Raia de Espanha. Serranias azuis e violentas que se ama-
ciam subitamente em olivais, campinas de trigo, planaltos de
terra vermelha. Caminhos de estevas, de fragas, onde o perigo
sai dos barrancos e dos muros, ou caminhos melancolicamente
guarnecidos de plátanos, abrindo clareiras na mata de pinheiros
mansos, de um verde calmo e opulento, onde se escondem os
celeiros das companhias agrícolas. Mas antes de os ganhões
desempregados e os contrabandistas de profissão chegarem a
essas terras têm de atravessar os baldios do seu país. Para
cá das faldas desabrigadas, com o rio Erges esmagado entre
muralhas de granito, o casario nasce dos moinhos afogados nas
enxurradas, sobe penosamente as margens das ribeiras, aga-
cha-se à sombra das rochas e espraia-se por fim em aldeolas
mesquinhas. Depois vem a planície, triste como um descampado,
devassada pelo vento de Espanha, que satura o ar de poeira
e solidão. Planície nua, crestada pelo sol, que amadura as infin-
dáveis searas de trigo."

Fernando Namora

 

quarta-feira, outubro 07, 2015

primus inter pares

Tantos e tantos anos sem entrar naquela casa. Apenas passava ao largo. E, no entanto, havia uma enorme vontade de voltar a passar aquelas portas e perceber se a memória continuava a guardar alguma coisa dos tempos passados entre aquelas quatro paredes. Foi preciso acordar cedo, enfrentar a chuva e ir ao seu encontro. Lá dentro, a casa continua exactamente como me lembrava. As colunas, o chão, os azulejos, os vidros, nada mudou. Está tudo bem conservado e parece que voltei décadas no tempo. Aqui e ali, pequenos recantos onde tantas estórias houve, onde tantas amizades nasceram. Mal consigo prestar atenção às palavras e canções que se ouvem ao meu redor, prefiro olhar para ali e para além e deixar a minha mente vaguear por todas as recordações que aquele espaço evoca. Mas a nostalgia vai-se dissipando e lentamente regresso ao presente e vou começando a ouvir as palavra que me chegam da outra ponta da casa. E aí sou atingido pela verdadeira mudança que está ali a acontecer. Ouço palavras que nunca ouvi, palavras que me tratam como o adulto que sou, que não condescendentes e que são realmente deste tempo. Definitivamente parece que o futuro desta casa vai ser diferente, não vai esquecer o seu passado mas parece que vai haver mãos para não deixar a casa morrer, não a deixar eternamente no passado. E fico satisfeito, sorrio e fico deveras surpreendido com tudo isto. Mas, repito, fico satisfeito que assim seja. Talvez que não vá ficar novamente tantos anos sem voltar a entrar aqui. Se este for o caminho, sem dúvida que podem contar comigo. E já era tempo de deixar entrar novos ares por aquela porta. Como se costuma dizer, aguardo com muita expectativa os próximos episódios. Bem hajam.


"Nascemos nus, húmidos e com fome. Depois a coisa piora."

 

quinta-feira, outubro 01, 2015

à distância

"Sei agora o que nunca soube - que o amor encontra o seu estado mais puro quando julgamos que o fim chegou; finalmente entendo que o amor pode ser precisamente essa ausência, o deixar de estar, ser capaz de apreciar cada minuto da nossa memória como se segurássemos, entre as mãos, um punhado de brasas num deserto de gelo."


João Tordo


 

sexta-feira, setembro 18, 2015

Sector terciário

As pessoas andam demasiado nervosas, agitadas. Sempre com pressa, sempre com muita pouca paciência, sempre a quererem estar debaixo dos holofotes, à frente e acima de todos. Determinadas em terem o que querem, quando querem e nas condições que lhes interessam e apenas a si. Se for preciso mandar uns berros, insultar alguém, tratar alguém como se fosse menos que eles, pois que seja. Houve ali um olhar impertinente? Mostre-se os dentes, levantem-se as sobrancelhas, grite-se do mais alto que os pulmões tiverem para oferecer. De uma simples palavra dita sem qualquer tipo de má intenção, faça-se todo um filme onde a sua importante pessoa tenha sofrido o mais grave dos ultrajes e humilhe-se até à exaustão o pobre ser que está do outro lado. Mas o que é isto? Como é que chegámos a este ponto? Como é que deixámos que a nossa humanidade pudesse passar a ser definida por títulos, ou bens, ou mesmo credos políticos, religiosos, nacionalistas ou mesmo desportivos? Toda a educação vai por água abaixo só porque não mereci toda a atenção do outro. Manifestemos toda a raiva e frustração que temos dentro de nós contra o primeiro pobre diabo que nos apareça pela frente e que apenas tentou ajudar a resolver um problema que afinal era apenas um pretexto para o "combate". E depois fica o sentimento de angústia e, no pior dos casos, a incerteza que fica a morar na mente de quem apenas tentou fazer o seu trabalho o melhor que pode e sabe. Mas para lá de tudo isso, fica a tristeza. O sentimento de que é triste haverem pessoas assim a atravessarem-se pelo nosso caminho, como um tsunami com consciência, apostado em submergir tudo aquilo que nos define. Tristeza.

quinta-feira, setembro 17, 2015

O verdadeiro alentejano

De que é que se conversa com alguém que conhecemos há sensivelmente trinta e cinco anos e com quem já não estávamos há pelo menos quinze anos? De tudo e de nada. De namoros, casamento, divórcio e descendência. De caminhos profissionais tão diferentes e com tantos pontos de contacto que, ao descrevermos alguns eventos, deixamos um sorriso cúmplice nos lábios. De viagens a mundos distantes, de viagens a mundos ao virar da esquina, das idas do campo para a cidade e vice-versa, como se de um truque mágico se tratasse. Da família, sempre a família ao nosso lado e a apoiar-nos, das cumplicidades maternais que vão ainda mais longe do que as nossas vidas, até a um tempo em que ainda só existíamos enquanto ideia desejada. De como ao fim de uma frase regressamos à nossa infância, como se nada se tivesse passado, como se nunca tivéssemos saído daquela sala de aulas magnífica, que tantas alegrias, conhecimento e amizades nos trouxe, daquelas quatro paredes onde aprendemos muito mais do que matemática ou português ou os rios e as serras deste país, onde verdadeiramente aprendemos a ser seres verdadeiramente humanos, onde absorvemos tudo o que uma professora/cúmplice/mãe/amiga (e tantas palavras poderiam aqui ser colocadas, ad eternum) nos legou e nos deixou mais ricos enquanto pessoas de, na altura, de palmo e meio. E tantas vezes a sua memória foi evocada que quase, quase nos permitimos ficar com os olhos marejados. Ela, os nossos antigos colegas, aqueles que gostávamos de encontrar mais uma vez, aqueles que desapareceram já deste mundo, os que se encontram em parte incerta, até mesmo aqueles que se deixaram ir por uma espiral de dor e tristeza abaixo, quando mereciam muito mais desta vida madrasta. Mas não falámos só do passado, também pensámos no presente, no futuro, na superação de doenças malditas, na superação do flagelo do desemprego, naquelas pequenas coisas que tornam a nossa presença nesta terra um bem inestimável. Falámos, falámos, comemos, falámos, bebemos, e no fim aquilo que foram horas, pareceram breves minutos. Foi bom, meu amigo, foi muito bom. E o melhor de tudo é que ficámos com a completa certeza de que haverá mais em breve, mais conversa, mais memórias, mais angústias, mais partilhas, mais anseios para o que aí vem. E a melhor certeza de todas, é que não vai passar tanto tempo até à nossa próxima tertúlia. Aqui te deixo um enorme brinde à tua vida, à tua coragem, à nossa bonita amizade que merecia este recomeço.


quinta-feira, setembro 03, 2015

Par la fenêtre

"La tristess qu'on ressent ao cours de la vie, c'est
quelque chose qui ressemble à mon ours vu de dos:
de loin, le coeur se serre douloureusement, mais si on
se met à la place de l'ours, voilà que, contre toute
attente, il frémit d'espoir et, qui sait, regarde le beau
spectacle qui s'offre dehors à ses yeux. Peut-être est-il
en train de s'extasier devant tant de beauté. Ce matin-
là, c'était mon coeur qui était triste, moi qui avais
dormi la tête enfouie dans la fourrure de l'ours. La
mort des parents de ses propres parents, la mort un
jour de ses parents, sa propre mort, la vie véritable,
qui ne fait qu'un avec la mort, avait frôlé de son aile
la chair de l'enfant dont le monde du rêve se poursuit
éternellement. J'avais sans doute senti l'indice de
quelque chose d'insondable."
 
Yoshimoto Banana
 
 
 

domingo, agosto 30, 2015

o prior de buarcos

      "Dizem-me que este tempo já não é para crença, que é
material e rude. Ah, filho, os tempos são sempre materiais e
vis; e o coração humano sempre da mesma idade - da idade
do mal e da dor."

Fernando Pessoa


 

domingo, agosto 09, 2015

Oblivious

"It's dark now. But they feel each others' breath. And they know all they need to know. They kiss. And they feel each others' tears on their cheeks. And if there had been anybody left to see them, then they would look like normal lovers, caressing each others' faces, bodies close together, eyes closed, oblivious to the world around them. Because that is how life goes on. Like that."








terça-feira, agosto 04, 2015

O luto de Elias Gro

"A determinado momento, mais tarde ou mais cedo, teremos
de encarar a inquietação que nos corrói e que faz doer a maior
ferida de todas - a que está no centro do nosso peito e à qual
chamamos, à falta de melhor palavra, vazio. Talvez nasçamos
com essa sabedoria; talvez suspeitemos desde tenra idade que,
um dia, plenamente e já sem margem para dúvida (esse ele-
mento fora da tabela periódica que corrói todos os outros), nos
renderemos àquilo que é."

João Tordo


 

terça-feira, junho 23, 2015

Um buraco no coração




(..."why do I fall in love with every woman I see who shows me the least bit of attention?")



segunda-feira, junho 22, 2015

domingo, junho 21, 2015

2666

" (...) quando é bem sabido, pensou Archimboldi, que a História, que é uma puta simples, não tem momentos determinantes, mas é sim uma proliferação de instantes, de brevidades que rivalizam entre si em monstruosidade."

Roberto Bolaño



segunda-feira, junho 15, 2015

Reclusão



A precisar de calor, Sol e luminosidade. Pelo menos, muito mais disto do que tem acontecido nos últimos dias. Caso contrário, ainda me arrisco a transformar numa batata de sofá...


sexta-feira, maio 22, 2015

Da memória que nos foge...

"A estação da Primavera vem todos os anos, não é? Mas a nossa não volta mais. A mocidade não volta mais. Acabou no fim!"



O Povo Que Ainda Canta



sexta-feira, maio 08, 2015

Para ti.

Meu irmão,
hoje cumpres mais uma Primavera. Que seja mais uma das muitas que te desejo, de preferência com a tua amizade como tem sido até aqui desde o momento em que nos conhecemos. E escrevo amizade quando devia escrever Amizade, pois há poucas pessoas neste mundo que me conheçam tão bem como tu. Temos estado juntos nos momentos bons, inesquecíveis, aqueles momentos que nos marcam para toda uma vida. E tem sido bom partilhá-los contigo. Mas também tens estado comigo nos momentos menos bons, naqueles que nos arrastam para o fundo escuro do poço, em que precisamos de uma mão amiga que nos puxe lá de baixo, que nos faça ver novamente a luz do Sol, a luz que deve invadir a nossa vida especialmente quando temos vontade de ficar nas trevas. E tu, meu irmão, tens estado sempre lá, quando preciso mais do teu abraço, da tua mão amiga, das tuas palavras que me empurram para a frente. Por isso, e porque não há prendas suficientes que se possam dar a quem queremos parabenizar com toda a felicidade do mundo, deixo-te estas pequenas palavras, de alguém que muito te admira, que quer continuar a ser teu amigo até andarmos de bengalas e andarilhos, e que quer sempre o teu bem, como se fôssemos realmente irmãos. Porque, não haja dúvidas quanto isso, és o melhor irmão quem alguém poderia ter. Seja aqui neste país pequenino mas tão grande, seja do outro lado do planeta no cimo de uma montanha com o vento na cara. Um grande, enorme abraço para ti.