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quarta-feira, novembro 25, 2015

Folk Nocturne

"Nós habitámos o tempo dos grandes fogos e o tempo da colheita,
olhámos tudo de nossa janela e muitas vezes corremos para entrar
nos campos, vimos centelhas perseguindo-nos pelas costas e pelas
barreiras laterais do corredor das chamas, algumas das centelhas
ficaram presas a nossas camisas, fomos de fogo, corremos para a
água para acalmar a nossa ferida. Certas feridas se transformaram
nas cicatrizes mágicas que nos sustentam até hoje. Vimos as larvas
desenvolverem-se no chão e algum caruncho comer nossos móveis,
foi assim que ganhámos consciência da constante mudança das coi-
sas. Nossos corpos mudavam tanto quanto as coisas. Perdemos pai
e mãe em nossa casa, perdemos a vontade e nos fizemos ao espaço
novo, fomos contra espelhos só para ver se doía e só para ver se a
sorte vinha, a sorte nunca veio, mentira, a sorte demorou a vir mas
veio nalgum dia. E depois se desfez de novo."

Matilde Campilho

   

terça-feira, março 03, 2015

M

“Porque tinha sal em minhas pestanas, porque existe um salmão dourado onde o amor sempre dança, porque a ideia de ir até o mar de metrô era a oração que nos fazia ficar acordados até de manhã, porque há um osso se estilhaçando constantemente dentro das paredes mestras e nós já sabíamos isso, porque a paixão não é de todo a coisa mais importante mas é sim o canudinho através do qual dá para ver que o mundo é muito feito de construções de papel — celulose que vem da árvore e que depois se transforma em lista telefônica de onde alguém arranca a página e logo transforma em veleiros e montanhas. Talvez porque na porta do restaurante habitual alguém toca clarinete ao sol, porque até as ruínas podemos amar nesta cidade, porque eu tenho um olho em você e você um dedo em mim (...)”

Matilde Campilho