sexta-feira, fevereiro 29, 2008

Pythonisms - II

"Os missionários que vinham falar à nossa igreja representavam outro tipo de fuga. Eu achava as cerimónias religiosas bastante aborrecidas até aparecerem os missionários. Eram espécimes físicos diferentes. Apareciam bronzeados e não tinham o aspecto de quem passara a vida fechado no vicariado ali ao lado. Fiquei bastante impressionado com as suas histórias, que envolviam sempre sofrimento, de um ou de outro tipo. Ou falavam acerca de pessoas com deformidades ou doenças horrorosas, ou de como tinham de ir de uma aldeia a outra atravessando pântanos, quase sempre infestados de crocodilos, e aí apercebíamo-nos de que o homem que estava a falar não tinha a mão direita, ou coisa do género. Um missionário na igreja, agarrado ao púlpito com um gancho em vez da mão, isso sim, é que alegrava a minha vida."

Michael Palin


A casa também te vê

"A casa também te vê, és o poema,
ambos enfrentando-se imóveis,
envelhecendo e com escritos."

Pedro Mexia


quinta-feira, fevereiro 28, 2008

Pythonisms

(ou em alternativa, e buscando inspiração no João Lisboa, Monty Python: autobiografia em pequenas prestações, ditos de espírito e sabedoria e, acrescento eu, humor tresloucadamente saudável)

"E numa das noites fiz um dos sketches que o John tinha antes escrito, uma coisa chamada «BBC BC», em que o Bill Oddie lia as notícias: "Boa tarde, aqui começam as notícias. Ficou a saber-se hoje que...". E eu fazia o boletim meterológico: "Sobre todo o Egipto, pragas seguidas de inundações, seguidas de rãs e depois a morte de todos os primogénitos - lamento muito, Egipto"."

Eric Idle

Desconcertante

Como, aliás, já o livro o era. Na verdade, se quisermos falar no casamento perfeito entre universos cinematográficos e literários, então um filme dos irmãos Cohen sobre um livro originalmente escrito por Cormac McCarthy deve andar lá perto. Um casamento negro, real, com a violência dos dias que vivemos sob um holofote intenso. E depois de visto, fica uma sensação de desconforto, que perdura bem depois de sairmos do cinema. Ainda não sei se gostei ou não do que vi. Ainda estou a pensar. E por isso não adianta muito falar ou escreve sobre No Country For Old Men. É preciso vê-lo. E vai haver quem o ame e quem o deteste. Visceralmente. Se calhar era mesmo isso o que os Cohen queriam. Nos dois sentidos. Apenas digo que o Tommy Lee Jones e o Javier Bardem são dois grandes, enormes actores. E às vezes bastam pormenores pequeninos para perceber isso, sejam as rugas do rosto de Ed Tom, ou o olhar frio, vazio de Anton. E se o país não é para velhos, definitivamente também não é para heróis ou homens sem réstia de pecados. É história cinematográfica, por isso há que não a perder. E não, ainda não sei se gostei ou não. Apenas espero que o João Lopes inclua também este filme nas suas Paisagens Americanas. Só os primeiros minutos do filme merecem isso mesmo, já para não falar de todo ele.

(Um filme com intervalo? Ora aí está algo que pensava já extinto...)

(Porque raio é que havia de haver pessoas a pensar que atender o telemóvel quando o filme já começou é uma boa ideia? E logo aos pares...)

(Tendo em conta o ritmo, qualquer dia este espaço cinzento ainda é rebaptizado de cinema cinzento.)


sexta-feira, fevereiro 22, 2008

Gargantas ao alto!


Para começar, não sou insuspeito. Gosto de quase tudo o que sai da imaginação de Tim Burton. O homem é provavelmente um dos meus realizadores preferidos e alguns dos seus filmes já passaram pelos meus olhos umas boas dezenas de vezes. Não me canso, é quase um vício. E mesmo quando ele decide fazer um musical, desta vez com pessoas de carne e osso (e sangue), é altura de rumar a uma sala de cinema e deleitar-me. E foi assim que fiquei quando o pano caiu sobre "Sweeney Todd - The Demon Barber Of Fleet Street", deslumbrado com o universo delirante de Mr. Burton, ainda que aqui numa versão um pouco mais sangrenta. Mas o filme é de uma beleza negra invulgar, onde as sombras e o desejo de vingança são também elas personagens centrais, ao lado de Depp e Bonham-Carter. Nada é o que parece, mas isso também não é surpresa nos filmes de Burton, apenas é elevada a um nível simplesmente sublime neste caso. E as músicas, e as letras são fenomenais, mesmo para mim que não conhecia o original. Tudo se conjuga em quase duas horas de pura magia. A sétima arte devia ser sempre assim.

"I can guarantee the closest shave you'll ever know."


Inutilidades - V

"Durante uma vida, uma pessoa anda o equivalente a duas voltas ao mundo.

Passamos ao longo da vida três anos na casa de banho.

(...)

Sem doenças de coração, nem cancro, nem diabetes, a humanidade teria uma esperança de vida de 99,2 anos.

(...)

Em cada dia, fazem anos em todo o mundo cerca de nove milhões de pessoas."

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quarta-feira, fevereiro 20, 2008

Fotos do Fogo


"E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes

encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes

ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos

E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se envolam tantos anos."


David Mourão-Ferreira


E foi tão bom rever-vos, meus amigos. Mesmo no meio da escuridão e das trevas que consigo traziam Noémia, Mariana, Octávio e todos os outros, almas demasiado condenadas pelo simples facto de terem existido num tempo diferente, tormentoso. No fim restou a minha ternura pela noiva, o meu coração despedaçado pelos gritos de Octávio, e a angústia por um dia ver os meus princípios tão amargurados como os de Noémia e Mariana. E que bonito que foi, meus amigos. O fogo que vos corre pelas veias merece bem um palco assim, ganho à partida. Do fundo do meu coração.



Uma história simples

É um ritual meu, sempre que o sono não me carrega nos seus braços por mais algumas horas. O mesmo é dizer que, aos domingos, se não estiver a trabalhar (sim, leram bem, não é um erro tipográfico) e se não me deixar adormecer, gosto de ir àquele café, beber do mesmo enquanto leio o jornal. Deve ser o único dia da semana em que o compro e acaba por ser uma mera desculpa para ficar ali, um par de horas perdido do resto do mundo. Pelo simples facto de estar ali, umas vezes absorvido pela leitura, mas na maior parte das vezes absorvido pelas pessoas que passam por ali. Não que sejam seres fora do normal, mas apenas pessoas às quais não prestaria muita atenção a não ser ali, parado e com aquilo que também parece um mundo parado à minha volta. Pessoas de todas as idades, géneros, sozinhas e acompanhadas. Vão passando por ali, tomam o pequeno-almoço, conversam, algumas também têm jornais consigo, outras demoram-se apenas o tempo de pedir, consumir e pagar a primeira bica do dia. Umas entram, outras saem. Por cima de todos nós, as ondas de éter de uma qualquer estação de rádio também ela perdida no tempo, ou melhor, no passado. E é neste quadro que normalmente o meu olhar vai sempre parar àquela figura, quase sempre sentada no mesmo sítio, quase sempre sozinha. Um senhor, provavelmente com idade para ser meu avô, sentado, com o boné do costume, a olhar para o lado de fora da enorme janela que ocupa parte das paredes. Sem jornal, sem café na mesa, apenas a olhar de forma tranquila lá para fora. Recordo-me da primeira vez que este senhor agarrou o meu próprio olhar. Fiquei intrigado. A paz do seu rosto contrastava com a aparente solidão da sua mesa. Fiquei perturbado, pois quase pensei que, não fosse o sorriso que ele ostentava, e quase que podia ser o protagonista de uma história por mim escrita há já algum tempo, num quarto de hotel. Mas essa história era demasiado deprimente e reflectia o encerrar de uma vida, e aquele homem ali, a duas mesas de distância da minha, e mesmo com os seus cabelos brancos, ainda parecia estar longe do seu próprio encerrar de capítulo. E foi nesse preciso momento, enquanto o meu cérebro começava a pedir-me timidamente para escrever a história daquele senhor, que o sorriso dele se tornou ainda mais radioso e então eu compreendi a sua espera. Pela porta do café entravam dois homens, duas mulheres e três crianças numa correria desenfreada que apenas parou junto da mesa do homem, que as abraçou e beijou, enquanto todos se iam sentando à sua volta. E assim se rompeu o aparente manto de isolamento do senhor, e a sua mesa rapidamente se tornou numa reconfortante confusão de conversas cruzadas, risos, olhares confidentes e sobretudo um carinho transbordante de todas aquelas pessoas pelo senhor que tinha idade para ser avô e pai de todos eles. Se calhar conto esta história porque, de certa forma, também acabou por ficar a fazer parte de mim. Seja porque lá do meu canto, tenha reparado neste pequenino momento de felicidade espontânea, seja porque acabei por assistir a várias reposições desta história. Uma após outra semana, toda a mesma sequência de eventos voltava a repetir-se, sempre com o desfecho esperado e por mim secretamente celebrado. É uma história que, mesmo com estas palavras que agora estou a escrever, não consigo traduzir propriamente da realidade que me é dada a assistir quase todas as semanas. Até no domingo passado, quando já chovia a rodos. Na verdade, parecia que a história teria outro final, pois o senhor esperou muito mais tempo pelos seus companheiros de mesa. Mas mesmo quando já me estava a preparar para sair, eis que o primeiro dos netos entra no café e se dirige ao senhor, abraçando-o com uma força de amor que me lembrou o meu próprio avô. E aos poucos eles foram chegando, sacudindo as gotas de chuva dos chapéus, e sentando-se à volta daquele homem cuja face irradiava felicidade por todos os poros.

Vai haver quem ache esta história ligeiramente lamechas, e outros até vão pensar que foi desta que a minha cabeça deu o berro, e que já estou pronto para a camisa de forças. Poderá mesmo haver quem pense que isto não passa de mais uma das minhas ficções. Mas a verdade é que todas estas palavras apenas serviram como uma forma de deixar a vida deste senhor, que não conheço pessoalmente, como uma memória bonita neste espaço cinzento.

Mas para os descrentes apenas posso deixar uma sugestão. Querem vir ao café no próximo domingo? Eu pago e vocês observam...

quarta-feira, fevereiro 13, 2008

Love Thy Apple

Uma dúvida assalta-me o espírito desde sexta-feira passada, mas a mesma apenas se concretizou há coisa de cinco minutos atrás, quando pensava em algo de inútil para escrever por aqui. Não será melhor passar o dia de amanhã a seduzir uma maçã? Assim como quem não quer a coisa, com um piscar de olho, uns piropos, uns beijinhos... até à trinca final...

E a culpa é toda deste gajo, que para além de dizer umas coisas com muita piada ainda faz uns truques jeitosos com vassouras e, claro, com maçãs...

sexta-feira, fevereiro 08, 2008

Inutilidades - IV

"O termo «fuck» é usado 256 vezes no filme Pulp Fiction.

(...)


Napoleão é a figura histórica que apareceu mais vezes em filmes, 194, seguido por Cristo, com 153.

(...)

Os relógios do filme Pulp Fiction estão todos parados nas 4h20.

A primeira descarga de autoclismo da história do cinema é no filme Psycho, de Hitchcock.

(...)

Molho de chocolate passou por sangue nos mais famosos 45 segundos de chuveiro da história do cinema. A cena de Psycho, de Alfred Hitchcock, demorou sete dias a ser rodada. O som das facadas foi produzido espetando um facalhão num melão."

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Brilliant!!!

It's an honour to say I know the guy who wrote this.

"“Any of numerous oval, flat-bodied insects of the family Blattidae, including several species that are common household pests.” Sometimes looking at definitions has a reassuring feeling to it… not this time, though."

(somewhere in Angola; good luck, Jorge)

quarta-feira, fevereiro 06, 2008

Heaven up there


Entrudo

Aquela era a sua altura preferida do ano. Somente naquela altura sentia uma sensação de liberdade e pertença como em nenhuma outra época de cada ano que passava da sua miserável vida. Apenas naqueles dias de folia podia passar despercebido nas ruas, passando entre pessoas que de outra forma não passariam nem a cinco centímetros de si, ou se o fizessem seria com uma expressão de asco ou receio estampada no seu rosto. Mas naqueles dias nada disso sucedia, deixava de ser um recluso da sua casa e deixava que o vento soprasse na sua face tapada, algo que já o deixava minimamente feliz, longe da exclusão que sentia no resto do ano. E era tão fácil, apenas precisava de uma máscara, uma peruca, até mesmo alguma maquilhagem, tudo pormenores carnavalescos, mas que para ele eram vitais para cumprir a sua encenação de pessoa perfeitamente normal. Este ano tinha optado, mais uma vez, pelo seu disfarce fétiche, aquele que, quase ironicamente, era o seu melhor "amigo" e que fazia com que a sua situação fosse menos real e um pouco mais teatral. Seria, mais uma vez, o Fantasma da Ópera. Quando se cruzasse com outros mascarados nas ruas e vielas da sua cidade, o seu sorriso seria, como sempre, de puro deleite ao pensar na suprema ironia que era vestir aquelas roupas, usar aquele chapéu e, principalmente, aquela máscara branca que apenas tapava parte da sua cara, exactamente aquela parte que se encontrava horrivelmente disforme e sem qualquer rasto de que alguma vez tivesse sido um rosto humano. Enquanto se preparava para colocar a sua máscara, não conseguia evitar um último olhar na direcção do seu reflexo no espelho e constatar que sim, o seu rosto continuava com aquele ar grotesco e que a qualquer momento os ossos da sua face iriam perfurar aquilo que ainda restava de pele, mutilando-o ainda mais e tornando toda aquela massa confusa de carne em algo ainda mais repugnante. No último segundo tinha-se lembrado das lentes de contacto coloridas, sabia que havia pessoas que se afastavam com a simples visão dos seus olhos. Aqueles olhos espectrais, com um cinzento que coloria a quase totalidade dos globos oculares, apenas com um pontinho preto pequeníssimo no centro. Aqueles olhos que lhe davam um aspecto bizarro e invisual, quando na verdade a sua visão sempre tinha sido perfeita, excluíndo a estética quase defunta da mesma. Nem mesmo naquela altura de disfarces excêntricos, os seus olhos passariam despercebidos. E ali estava ele, o Fantasma, devidamente pronto para correr as ruas, para sentir as pessoas próximas de si, sem medos interiores, para sentir a vida que andava lá fora, sem ter de andar pelos becos mais escuros ou pelas ruas menos movimentadas. Não, hoje era Carnaval e o céu era o infinito. Quem sabe se até não poderia conhecer alguém interessante, alguém que se deixasse seduzir pelos seus gestos teatrais, pela sua capa esvoaçante, ou pela sua máscara enigmática. Sabia que tudo isso era possível, a partir do momento em que a sua face estivesse escondida de olhos alheios. Sim, iria conhecer uma mulher deslumbrante, encantá-la com as suas palavras emotivas de quem reencontra novamente a sua liberdade, beijá-la docemente como quem saboreia um néctar há muito desejado, e finalmente levá-la para o seu apartamento e descobrirem os seus corpos nos lençois da sua cama. Mas sem nunca tirar a máscara, claro. Isso era algo que estava reservado para o momento final da sua "actuação". O momento em que as suas mãos começariam a apertar levemente o pescoço dela, quando a sua respiração começasse a ser mais espaçada e com enormes inspirações a tentarem ganhar o máximo de ar possível. Só nessa altura, quando ela já soubesse o destino que a aguardava, apenas aí ele retiraria a máscara e deixaria que o horror da sua cara disforme invadisse o olhar da sua vítima, apertando-lhe o coração inundado de horror, enquanto o seu último suspiro ecoava no quarto. Sim, seria assim que tudo se passaria, mais uma vez. Olhou para o relógio. Era tarde, já era tempo de estar na rua, com os outros mascarados. Não podia ficar perdido, a pensar em Carnavais passados, em mulheres passadas. Estava na hora dos foliões e ele queria ser mais um, mergulhado no seio de toda aquela massa anónima. Disfrutanto da sua liberdade por mais um ano...


terça-feira, fevereiro 05, 2008

Samba p'ra que te quero

Havia algo que era para escrever hoje, mas vai ter que ficar para amanhã ou depois, visto hoje ter sido o dia de fazer rigorosamente nada. E que bem que soube...

Ah, outra coisa. Tenho que começar a deixar de ir ver filmes onde (quase) todas as personagens principais acabam por ter um fim trágico. Começa a ser um bocado deprimente, ainda que acabe por ter que me rir da situação. Se calhar tenho que passar a ir ver reposições de filmes antigos da Disney... Todos excepto o Bambi, como é óbvio.


sábado, fevereiro 02, 2008

Inutilidades - III

"A aliança de casamento deve ser usada no anelar, porque a tradição diz que passa nesse dedo uma veia que o liga directamente ao coração, a sede do amor. Normalmente deve usar-se na mão esquerda, mas na tradição judaica, a aliança vai para a mão direita. Também as freiras usam na mão direita a aliança que simboliza o seu casamento com Cristo. Mas sempre no anelar.

(...)

Na Grécia, as noivas devem pôr açucar dentro da luva da mão esquerda, para levarem doçura para o casamento.

(...)

As festas de casamento dos beduínos incluem o maior prato de toda a gastronomia mundial. Trata-se de camelo no espeto. Um camelo é recheado com um carneiro, por sua vez recheado com galinhas, por sua vez recheadas de peixe, por sua vez recheado de ovos."

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