Já passaram quase três anos. Quase três anos que o Bernardo se "juntou às estrelas", como diz o Carlos Martins. Quase três anos que este pequeno país ficou musicalmente, humanamente mais pobre, mais cinzento, com menos luz no meio de nós. Valha-nos a memória, os discos, a presença em ondas sonoras de quem nos faz muita, muita falta.
E valha-nos também o novo disco de Carlos Martins. Uma homenagem bonita, sincera, despida de outros conceitos que não seja celebrar a vida, a música, o homem que Bernardo foi e ainda é nos corações de quem não se cansava de o ver, curvado sobre o piano, intensamente tocando e tirando notas de porcelana daquelas teclas que os seus dedos percorriam sem se cansarem. Valha-nos a música. Valha-nos as palavras que o próprio Carlos escreveu para este disco, que nos deixam com os olhos turvos, à beira das lágrimas, mas ainda assim com um leve sorriso, um sorriso por haver amizades assim, eternas e feitas de muito amor.
“A primeira música deste disco, Caminho da Manhã, cujo título se
inspira num texto lindíssimo, uma oração de Sophia, estava a ser escrito
quando na noite de 10 de Maio de 2012 o Zé Pedro me ligou a perguntar
se tinha estado ou sabia onde estava o Bernardo Sassetti. Menos de uma
semana antes tínhamos almoçado, eu e o Bernardo, e tínhamos combinado
fazer um CD “espiritual” cheio de silêncios e contemplação, e eu sabendo
da sua capacidade de produção tinha resolvido começar nesse dia. Depois
desse telefonema ainda consegui rever alguns acordes que me soavam já
distantes mas não consegui trabalhar mais. Aquela ausência já estava
dentro de mim, tal como a esperança de que nada de mal tivesse
acontecido, e na verdade já tudo tinha acontecido. Essa ausência, gosto
do nome em inglês, Absence, haveria afinal de se confirmar e de se
tornar no golpe mais fundo na minha alma depois da morte dos meus pais.
Durou até agora o silêncio que me alagou o espírito e a vida. Este disco
é uma libertação e uma dedicatória de amor ao Bernardo e ao seu
inspirador talento como homem e artista: Absence são as minhas saudades
tuas e o cumprir da promessa de gravarmos algo que poderia ter uma forma
assim de silêncio e contemplação. E por ironia do destino entras ainda a
tocar neste disco e fazes no fim da última faixa, com a divina graça
que te sorria, uma referência às “estrelas” onde agora habitas. No resto
das canções eu, o Alexandre, o Carlos e o Mário ainda te ouvimos
enquanto fazíamos os arranjos ou gravávamos em estúdio. De resto oiço-te
quase todos os dias…quer se trate de “um assunto muito sério” ou a
dizer: “Tá Boa”!
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