quarta-feira, setembro 24, 2008

A sensação de inquietude voltou a aparecer hoje. Por uns breves segundos, tive a confirmação que os meus piores receios tinham todo o fundamento. Que tudo tinha sido arduamente real. Que os olhos que eu não conseguia deixar de ver na minha mente e que não me tinham permitido dormir um sono que não fosse desadormecido eram mesmo verdadeiros. E que decidiram aparecer de novo, no meio da multidão, no meio de uma jornada de trabalho intensa, como chamas infernais a emergirem do tumulto do quotidiano. E o medo tomou conta de mim. Não fugi, fiquei apenas imóvel, em antecipação, esperando a tormenta de ter de me confrontar de novo com aquela mancha de solidão inóspita, materializada no corpo dela. Não sei bem o que me passou pela mente, mas por um infímo momento senti uma voz a clamar dentro de mim, a pedir-me que não fugisse, que enfrentasse aquele temor, aquela premonição de um futuro possível. Que não sucumbisse à fraqueza de não ser capaz de perceber o que tudo aquilo significava. E foi nesse infímo momento que decidi, ainda que imobilizado por um pânico desavergonhado, que não fugiria, que ouviria os seus desabafos, os seus anseios e ténues esperanças, as suas mágoas e o seu coração a sangrar, e, acima de tudo, os seus olhos suplicantes, a humilharem-se por um pouco de condição humana, de um toque, de uma palavra. Assim estava eu, vacilante, à espera do momento em que teria mais uma vez aquele ser destroçado diante de mim, despida de qualquer réstia de ilusão de uma felicidade que estava afastada há muito. Mas o momento nunca veio. Tão depressa como a vi, assim ela desapareceu no meio da turba de pessoas, ela mais a sua sombra negra de solidão. E lentamente o bater do meu coração começou a abrandar, ao aperceber-se que os meus pesadelos mais sombrios iriam continuar escondidos num qualquer recanto mais obscuro da minha consciência.

E entretanto comecei a pensar que iria ter mais uma longa noite pela frente. A confrontar os demónios que iriam mais uma vez emergir do azul dos olhos dela.

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