quarta-feira, maio 30, 2007

"(...) Uma peça que nem sequer está fora do sítio... uma peça que não está em lado nenhum, e a Morte no fim do caminho a indicar que até para uma rosa há um destino a ser cumprido."

Saio para a rua. A minha alma já não aguenta estar entre aquelas quatro paredes, a sombra do desespero e da saudade sempre a pairar. Saio para as ruas da minha cidade. A cidade que deixei para trás mas que, no fundo, nunca me deixou. Por muitos quilómetros que me tivesse afastado, os seus nomes, as suas esquinas, os seus prédios, as suas pessoas sempre foram fantasmas, a assombrarem o meu cérebro nos piores dias. Nos dias em que percorria as ruas da minha outra cidade, olhava para o céu e me perguntava o que fazia eu ali. O desconhecido sempre exerceu o seu fascínio sobre mim, mas esse fascínio podia ser como o perfume efémero de uma rosa, deixando apenas um cheiro acre a traição. Teria eu traído a minha cidade de sempre? Seria por essa razão que ela tinha mudado tanto ao ponto de eu a achar irreconhecível? Ou seria a minha pessoa que tinha passado por tantas mudanças que me custava a encaixar novamente neste quotidiano de tempos passados? Precisava de ar. Respirar as ruas novamente, percorrê-las centímetro a centímetro, encontrar as amizades que não se esqueciam, reencontrar a minha mesa do meu café preferido. E, quem sabe, se fosse mesmo sortudo, cruzar-me com amores antigos, paixões com alguma chama ainda, nunca se sabia. Com um sorriso amarelo, depressa me apercebi que estava a enganar-me. Nada daquilo estava à minha frente. Apenas um pequeno mundo que já não era o meu. A vida ali tinha seguido o seu rumo, não necessariamente o mesmo que o meu. O sentimento de estrangeiro numa terra estranha já me era familiar, mas aqui? Na cidade que me tinha visto nascer e crescer? Não me sentia bem. A minha cabeça parecia estoirar. As minhas entranhas, sentia-as na garganta, a sufocarem-me. Parecia que ia desfalecer. Cair, ali, fulminado, como uma sensação de repetição se tivesse apropriado daquela casa. Tinha de sair. Sair dali. E caminhar. Caminhar em frente.

10 comentários:

gi disse...

a geografia dos afectos, essa outra cartografia.
porque toda a cidade é uma cidade única e irrepetível, para cada um de nós.
- quantos sonhos, naquela parede;
- quantas lágrimas, naquela praça;
- quanta alegria noite fora, ali mesmo, junto àquela árvore que parece retribuir o nosso olhar.
quantas memórias.
quantas saudades por cumprir.
(e outras tantas cumpridas!)

um abraço.
gi.

Nuno Guronsan disse...

Sim, de um lado a geografia dos afectos, mas, por outro lado, há também a geografia da dor, daquelas memórias que apertam o coração e nos trazem as lágrimas aos olhos...

Mas as tuas palavras fazem todo o sentido... A saudade enquanto parceiro de viagem...

Abraço.

inBluesY disse...

como entendo este texto.

Nuno Guronsan disse...

A maravilha de escrever acaba por ser o estreitar de proximidades. Ainda bem que o entendes...

Anónimo disse...

Custa muito admitir isto...
Um dos meus receios é exactamente o voltar à cidade onde mais fui feliz, sei que me vou sentir tal como tu, uma estranha numa cidade estranha.

A única solução é caminhar mesmo quando o que mais queremos é fazer o tempo voltar atrás.

Um muito obrigada pela teimosia.
Não imaginas como me faz bem!
:)
**

Nuno Guronsan disse...

A cidade onde fui mais feliz... essa é muito complicada de definir... mas há imensas cidades onde gostava de voltar, um dia destes. E depois há uma cidade que me inspira enormes saudades de tudo, dos olhares, dos cheiros, de tudo e mais alguma coisa. A tentação para lá voltar é muita mas, ao mesmo tempo, questiono-me se não irei deteriorar a imagem que tenho dela. Já não será a mesma cidade que deixei, com toda a certeza, e isso assusta-me...

A teimosia é como as pilhas do coelhinho, e dura, e dura, e dura...

Beijos.

A disse...

Ainda estou a pensar....


still thinking.... estou entretida com coisas mais divertidas, como por ex: arranjar uma celebridade que tenha os mesmos traços perfeitos do meu rosto LOL


Beijos, colega (não se aprende nada)

A disse...

... e já vou na 5ª fotografia... à Patrícia só lhe deram gajas boas, a mim nem UMA!

ehehehehe

(insónia)

nana disse...

posso caminhar um bocadinho contigo?....

Nuno Guronsan disse...

Claro que sim. Serás bem-vinda a juntar-te a mim no caminhar deste Espaço. Até porque eu também sou uma parte de maresia ;)

Beijos.