sábado, dezembro 30, 2006

Recta Final

O Citador brindou-me hoje com esta bonita frase do Camus:

"
A verdadeira generosidade para com o futuro consiste em dar tudo ao presente"

Não consigo pensar em melhores palavras para "enfrentar" o novo ano que está quase aí ao virar da esquina. Não sei o que me espera em 2007, não sei se será melhor ou pior que 2006. Não sei se anseie por grandes mudanças ou se desejo que apenas corra um bocadinho melhor que o ano que agora termina. Não sou pessoa para ficar a meditar longamente sobre isso. Prefiro pensar que com mais um revolver deste nosso pedaço de rocha onde todos vivemos nos tornemos todos melhores seres humanos. Pelo menos assim o desejo com todas as fibras do meu corpo. Boa recta final e um melhor início de um novo caminho anual. Para nós todos.



quarta-feira, dezembro 27, 2006

Memórias

Não conseguia pensar noutra coisa que não fosse o vento. Era sempre a primeira coisa que lhe vinha à cabeça quando recordava aqueles dias de folia. Primeiro a inocência das brincadeiras de criança habituais nos domingos de praia com a família. Depois a inocência perdida nos braços dela, no seio das dunas que se agitavam com o mesmo vento de sempre. Os seus corpos presos um ao outro, o calor do sol misturado com o seu próprio calor, a areia que voava ao redor deles. E onde tinham ficado esses dias? O tempo tinha-os enterrado bem fundo no seu coração, a memória tinha ajudado a cavar esse buraco. A imagem dela era já bastante desfocada, apenas se lembrava do azul dos seus olhos, que faziam o céu ficar pálido e as ondas do mar recuarem de vergonha. Um azul suficientemente poderoso para que ele se tenha perdido uma e outra vez na sua imensidão. E no entanto, tudo lhe era pouco familiar. As fotografias ajudavam-no a recordar-se, mas pouco mais. Apenas o som do vento nos seus ouvidos e a areia a bater-lhe suavemente no rosto. Apenas isso.

Exclusivo!

Exclusivamente aqui, o conteúdo da carta de Ahmadinejad ao Papa Bento XVI. Reza assim:

"Esteja descansado, sô Bento, que quando a malta tiver umas quantas ogivas nucleares, prometo solenemente e por Alá, que o Vaticano será a única nação que eu NÃO vou riscar do mapa. Palavra de
Mahmoud, sô Bento. Até porque eu sempre achei piada àquela coisa da varanda na praça. E depois a mitra é uma barrigada de riso..."

(Diário Digital)

E para quando um programa na RTP, estilo "As cartas de Mahmoud"? Sugiro já o nome da Catarina Furtado para moderadora!

terça-feira, dezembro 26, 2006

Mix de Prendas


Obrigado, família, aos poucos vão sabendo aquilo que me preenche a minha alma e, com o passar dos anos, os "tiros" certeiros são mais que muitos. E tu, Só, fazes parte da minha família de afectos. Afinal de contas, já são uma boa dezena de anos de amizade. Obrigado a todos por terem feito parte do meu Natal, muito para lá das prendas.

segunda-feira, dezembro 25, 2006

Outros anjos

"... Ou seremos nós que temos um Natal cá dentro, e uma estranha vontade de o viver?"

Sim, sim, sim! Não poderia haver uma melhor frase para este Natal que ainda estou a viver. Obrigado pelo conto de Natal camuflado.

domingo, dezembro 24, 2006

x-mas sms

"Q o teu Natal seja muito feliz, abraçado com amor, e enfeitado com alegria, e q a ternura deste dia esteja presente em cada dia de 2007!"

"Natal?Sininhos?Anjinhos?Familia!?Presentes?Amor?Afecto?Paz!?GRANDE TANGA!O que a malta k e cerveja, sexo e boas festas no corpo todo.Um feliz natal 1 bom ano novo cheio de coisas boas."

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''''''''U''''''''
"Feliz Natal. A arvore pode ser "artificial" mas os meus desejo sao bem reais e sinceros! FESTAS FELIZES c mt saude, amor e paz na companhia de todos aqueles q amas. Beijos natalícios :-D"

"Tou a preparar os meus presentes. Pra ti, escolhi a realizacao dos teus sonhos, embrulhados em mto AMOR,PAZ,SAUDE,ALEGRIA e FELICIDADE. Votos de 1 Natal magico."

"A todos os meus amigos,familiares e conhecidos: Informo-lh d k ja me encontro disponivel para aceitar as prendas d natal referentes ao ano d 2006. Evite correrias d ultima hora e filas no acto da entrega...Aceito dinheiro vivo e até cheques,passagens aéreas,joias,perfumes,roupas d marca,telemoveis d topo d gama, entre mtx outras coisas d valor, e n s esqueca tudo da melhor qualidade.Muito obrigado."

"Um Santo e Feliz Natal e 1 Ano Novo recheado de coisas boas e muitas felicidades."

"Deste ano,guarda o que é bom de guardar e Vive o proximo com a certeza que tudo pode ser sp Melhor...Por ixo Antes k 2006 acabe,Antes k as SMS se acabem,Antes k a memoria s apague,Antes k ñ haja Rede,Antes de ficar cm os Copos e perder o TeLeLe. Te desejo UM NATAL FELIZ e um 2007 sempre à Abrir :)))"

"Na lua 1 anjo toca flauta a sua melodia desce sobre a nossa almofada e nas asas traz a cor dos nossos sonhos onde nos embala dizendo baixinho: Feliz Natal!"

"Nesta altura as palavras sao sempre as mesmas,mas é mto bom ter a kem as mandar e com certeza kem as recebe gosta. Feliz Natal e um Excelente 2007!!"

"Neste Natal armei uma arvore com raizes profundas dentro do meu coracao nela coloquei o nome dos meus amigos BOAS FESTAS.UM FELIZ NATAL e BOM ANO NOVO."

"Do Presidente: Caros dragoes. Este ano nao vai haver presepio no dragao. A vaca fugiu."

"Um amigo é um fruto raro e doce num mundo amargo. A amizade conhece o tempo exacto das palavras e dos silencios. Feliz natal e bom ano novo."

"Q as pulgas de 1000 caes vadios infestem o cu daqueles q t lixaram este ano e q os seus braços encolham tanto q n o possam coçar! Feliz natal akele abraco."

"Feliz natal. E um 2007 cheio de saude, concretizacoes, leveza, convivio e garra de viver."

Véspera

Para mim, Natal significa partilha. Partilha de nós próprios, do amor que sentimos pelos outros, e do amor que recebemos dos outros. Apenas este triunvirato importa. Não se trata de pinheiros, nem de presentes e muito menos de iluminações absurdas. Se quiserem, é uma altura do ano em que não há restrições para a quantidade de sorrisos que podemos presentear-nos todos os dias. Ninguém nos pode criticar porque assobiamos, cantamos ou mesmo rimo-nos sem motivo aparente. Ninguém nos vai achar mais insanos por causa disso. E isso, garanto-vos, é o que acontece, salvo algumas excepções, no meu Natal. Mais precisamente, neste Natal. Sei que vai ser um Natal inesquecível, que vou ter que arranjar mais espaço no disco rígido para as memórias que vou ter de guardar. E tudo porque vou estar rodeado de pessoas que muito amo e que sei que nutrem o mesmo sentimento por mim. Que todas elas vão fazer com que muitas das minhas preocupações e angústias desapareçam por uns dias, para serem substituídas por infímos momentos de prazer e alegria e que não têm preço. Porque vão contribuir para mais um encerrar de ciclo. Aliás, o Natal também significa isso para mim, balanço, fecho, regularização de "contas", novo percurso, inícios novos, muito mais que o fim de ano. Mas se por um lado sei que vou ter um Natal realmente festivo, por outro também derramo alguma tristeza do meu coração, pois ao mesmo tempo gostava de estar com algumas pessoas que sei que vão ter um Natal com lágrimas. Pessoas que vão sentir a falta de alguém que não vai estar com elas quando abrirem os presentes à meia-noite. Pessoas cujas lágrimas eu podia "guerrear" com a minha presença, com o meu amor, com a minha amizade, com o meu sorriso. Pessoas que amo incondicionalmente e em quem vou estar a pensar, mesmo no meio da confusão generalizada da consoada.

Desejo a todos os meus familiares, amigos, colegas e visitantes "bloguistas" um feliz Natal e que a felicidade do Natal que vou ter este ano chegue também aos vossos lares, onde quer que se encontrem.

Fica aqui uma das razões pelo qual sinto ainda mais alegria neste Natal de 2006. A certeza convicta na minha alma de que não me limitei a uma existência normal. Obrigado.

(Clique na imagem e também aqui)

sábado, dezembro 23, 2006

Mais prendas de Natal...

... que poderão vir a ser uma excelente companhia para as longas noites frias que se aproximam. Agradecendo respectivamente ao barros e à febra (espero que a vossa "lua-de-mel" continue em grande), e ao meu sócio e à barriguda temporária, a quem espero poder brindar à saúde da Carolina. Muita felicidade para vocês todos é o que eu desejo.

Peças de Roupa















(Lavadas, engomadas e remetidas para uma Lenta Divagação)

terça-feira, dezembro 19, 2006

O anjo

Miguel era um anjo irrequieto. Andava sempre de um lado para o outro do Paraíso, nunca conseguindo estar parado por muito tempo num único sítio. Na verdade, isso era mentira. Havia um sítio onde Miguel passava horas e horas da sua eternidade. Sempre na ânsia de um dia poder passar para o lado de lá. As portas do Paraíso exerciam um poder enorme sobre ele. Cada vez que S. Pedro se virava, lá estava ele, de volta dos portões, apenas para olhar para a enorme chave que pendia da cintura de Pedro. Os seus olhos suplicavam por aquilo que Pedro já há muito sabia. Miguel queria descer à Terra por uma última vez. Já pouco se recordava do que por lá tinha vivido mas algo na sua alma agitava-o para lá voltar. As recusas para conceder tal pedido duravam já meia eternidade e até S. Pedro começava a ter alguma compaixão pelo pedido de Miguel, mas que havia ele de fazer? O abrir das portas a um anjo não dependia dele. Até que um dia, em que Miguel se encontrava em cima de uma nuvem, quase coberto pelas suas asas, S. Pedro se aproximou dele e lhe deu a tão esperada notícia: em virtude daquele ser um tempo santo e de festa, Miguel tinha autorização para passar as portas do Paraíso e descer por uma última vez à Terra. Miguel quase não acreditava nos seus ouvidos. Voou e voou de alegria e contentamento. Se não fosse o respeito que tinha ao santo, teria-o abraçado e rodopiado no ar com ele. Num acto solene, S. Pedro rodou a chave na fechadura e abriu as portas do Paraíso para Miguel. Este respirou fundo, abriu as suas asas e voou através das portas divinas, mergulhando no seio das nuvens. Depois de muito tempo a voar, Miguel começou a ver umas pequeninas luzes ao fundo da escuridão. Aquelas luzes lembravam-lhe algo mas não sabia bem o quê, uma memória escondida nalgum recanto da sua alma. As luzes começaram a ficar mais nítidas, a cidade estava agora por baixo dele, começava a ver os rostos das pessoas. Ninguém o via, claro, era uma das condições para ele se ter ausentado do Paraíso. Aquela cidade tinha sido, em tempos, a sua cidade. Agora era-lhe estranha, estava repleta de luzes de Natal, estava mudada. As primeiras impressões de alegria que tinha tido quando chegara começavam a afastar-se, ele próprio começava a aperceber-se que a sua casa era agora outra. Voando por entre os prédios, via poucas caras com reflexos de felicidade. A maior parte mostrava-se fechada, apressada, a correr de um lado para o outro, sem tempo, sem a chama da alegria nos olhos. Miguel chorava. Chorava porque aquela cidade que lhe tinha dado momentos de alegria (mesmo que não os recordasse como deve de ser) estava diferente, para pior. Mas foi nesse momento, quando limpava as lágrimas, que viu algo que lhe chamou a atenção. Um anjo. Um anjo feito de luz. Mas não era um anjo qualquer. Aquele anjo era-lhe familiar. Miguel aproximou-se daquela luz. Não, não era um espelho, mas... Sim, eram as formas de Miguel que ali estavam, representadas naquela decoração, naquela praça. Aquelas asas. Eram as suas. Aquele manto. Era o seu. Miguel estava confuso. E depois reparou naquela pessoa em pé, diante do outro Miguel, o de luz. Foi descendo devagarinho até se encontrar ao pé da face daquela pessoa. E nesse momento sentiu um arrepio. Mas os anjos não sofrem arrepios, pois não? Mas Miguel tinha-o sentido. Aquela cara. Aqueles olhos. Aquela expressão triste. Miguel conhecia aquela pessoa. Beatriz. Sim, era esse o nome dela. Mas não conseguia lembrar-se de mais nada. Quem seria ela? E porque é que Miguel a reconhecia? Não o sabia, por mais que tentasse procurar no seu âmago. E já não tinha tempo para o procurar. Ao longe ouvia já a voz de S. Pedro, dizendo-lhe que era tempo de voltar. Miguel começou a elevar-se, cada vez mais alto. Ao longe ainda conseguia distinguir as figuras de Beatriz e do anjo de luz, qual delas a mais intrigante. Sentia-se em paz. Era tempo de voltar às nuvens.

segunda-feira, dezembro 18, 2006

The Departed

"When I was your age they used to say you could become cops or criminals. What I'm saying to you is this... When you're facing a loaded gun, what's the difference? "

domingo, dezembro 17, 2006

Thank You, Time!

Não me considero um brilhante exemplo da geração informática que domina, hoje em dia, grande parte da nossa sociedade. Mesmo que haja pessoas, no meu escritório, que me consideram uma espécie de permanente help-desk. Desde que comecei a lidar mais regularmente com a Internet, o mail, os chats e quejando, nos idos de 94, que sempre o fiz numa lógica de curioso, aprendendo coisas por mim, e aprendendo com os que me rodeavam e que realmente percebiam disto. Mas há um parágrafo neste texto com o qual me identifico bastante. É mesmo uma questão de paixão. Não nos submetermos a uma lógica de rotina, na qual temos "coisas" que nos distraem e, mais grave ainda, distraem os nossos neurónios e os inibem de fazer aquela ginástica mental de que tanto me falavam alguns saudosos professores que tive ao longo dos anos. A Web permitiu-me conhecer pessoas dentro deste país que me abriram novos olhares para coisas que desconhecia. O e-mail permitiu-me escrever aos meus familiares e amigos quando estive a milhares de quilómetros de distância deles. Este Espaço que aqui está já me permitiu conhecer pessoas que, sinto-o, já deviam fazer parte da minha vida há mais tempo. E é por isso que agradeço este prémio, em meu nome e em nome de todos aqueles que o merecem verdadeiramente. Todos os dias fazem por o merecer. E porque, afinal de contas, todos nós o merecemos muito mais do que o gajo que o ganhou em 2004...

Uma prenda de Natal...

Obrigado, coelhinha Duracell! Quase que me levavas a cumprir aquela promessa antiga que te estou a dever. E podíamos fazê-lo ao som desta música linda que está aqui por baixo, numa de inspiração :))) És uma amiga linda e só quero a tua felicidade, neste e em muitos e muitos Natais!

quinta-feira, dezembro 14, 2006

Outra prenda de Natal?

Apesar do arrepio que me causa ver as polícias portuguesa e espanhola juntas, fico a questionar-me se será desta que a minha carteira reaparece algures nas calles de Madrid. E fico ainda com esperanças que um dia o meu amigo Suburbano descreva a sensação de estar numa esquadra espanhola...

A minha tentação

E assim chegou a minha primeira prenda de Natal. As minhas visitas lembraram-se de mim e trouxeram-me um pedacinho da minha infância, que há muitos anos não provava. Graças a este pequeno doce, fiquei imortalizado no meu seio familiar através de uma lenda (ou mito urbano, o que preferirem). Consta que quando eu tinha meia dúzia de anos vividos e chegava o Natal e as mesas familiares ficavam decoradas com doces vários durante todo o período natalício, independentemente da casa onde eu estivesse, que eu, a meio da noite, me levantava qual sonâmbulo e percorria a casa em direcção à mesa e me deliciava com estes doces divinos. Se eu me lembro? Da parte sonâmbula tenho dúvidas, acho que é mesmo uma lenda familiar, que irá por certo passar de geração em geração, tal como o amor do meu primo pelas batatas fritas da minha mãe. Mas os confeitos... Esses nunca os esqueci, e foi bom reencontrá-los depois de tantos anos...

quarta-feira, dezembro 13, 2006

Bom Conselho


Visitas

Ele tem 85 anos. Ela tem 87. A sua vida juntos já dura há uns 65 anos. À sua volta foram crescendo filhas, netos e bisnetos. Tiveram momentos de grande felicidade e outros de grande tristeza. Passaram vésperas de Natal onde pouca comida havia na mesa e contentavam-se com o calor da sua lareira. Outras vésperas houve onde éramos cerca de trinta pessoas naquela pequena cozinha, e parecia que o Natal era o momento mais feliz do ano. Lembro-me da alegria que sentia quando chegávamos e eles lá estavam, nas escadas da casa, com um sorriso tão grande como o meu. Apesar do passar do tempo, parecia que todos os anos aquela imagem se mantinha, perpetuada quase ad eternum. Mas afinal não, o tempo também os atingiu, as pernas foram falhando, e o cesto dos remédios foi aumentando de tamanho. Algumas das suas ideias começaram a chocar com as minhas, começava a sentir os primeiros sinais de um fosso de princípios que existia entre nós. Ela condescendia e prefiria conversar comigo sobre aquilo que nos aproximava. Ele levava a peito e preferia envolver-se em discussões sem fim comigo. Mesmo quando defendia os meus ideais com unhas e dentes, nunca conseguia faltar-lhe ao respeito, seria um crime. Hoje em dia, eles envelheceram um pouco mais e eu cresci um pouco mais. Ela continua a conversar comigo sobre as coisas pequeninas das nossas vidas e das quais gostamos. Eu gosto de ficar a brincar com as rugas das suas mãos. Ele está mais "quebrado", mas só com as coisas recentes. Fico horas a ouvir as suas histórias de quando era um jovem e vivia no mesmo país que eu mas num universo completamente diferente. Algumas das histórias já as sei quase de cor mas continuo a gostar de o ouvir recitar todos aqueles pormenores que se agarraram à sua alma e continuam a viver pela sua boca. Todos estes anos houve uma coisa que permaneceu e que nos une, os nossos sorrisos. Este Natal vai ser diferente, este Natal tenho a vossa companhia e vou recordar momentos antigos e viver momentos novos que sei que ficarão guardados na minha memória. Obrigado por existirem e sejam bem-vindos.

quinta-feira, dezembro 07, 2006

Ondas Sonoras - XXI

No início apenas se ouve o silêncio.
O silêncio quebrado com o vibrar de uma corda.
É ele que começa a anunciar a sua presença.
Primeiro de forma muito leve e depois já de forma intensa.
Carlos passa as mãos pelas cordas.
As notas vão-se agrupando pela sua batuta.
Primeiro de forma solta e depois de forma familiar.
Á medida que Carlos percorre as cordas, o som vai-se entranhando.
Conhecemos estes sons de algum lado mas não sabemos de onde.
O contrabaixo parece ser estranho a esta canção.
E depois, entram os restantes convidados, sem se fazerem anunciar.
O Frank solta algumas notas étereas da sua guitarra.
O Jim vai libertando docemente as peles da bateria.
Por cima de ambos, o contrabaixo impera.
Mas depois a guitarra torna-se mais eléctrica, mas sem distorção.
Quase que repetindo as notas que o Carlos já tinha tocado.
E aí reconhece-se um pouco mais a canção.
Mas falta-lhe algo, falta-lhe a voz.
Não tem a voz humana, mas tem outras.
O susurro suave e melancólico do contrabaixo.
A urgência eléctrica da guitarra.
A brisa e o ritmo dos pratos da bateria.
E de súbito aproximamo-nos do fim.
E o Carlos decide tirar mais duas ou três notas das suas cordas.
E os três juntam-se para terminar a canção.
E depois de termos sido embalados, deixamo-nos ficar novamente em silêncio.

(Dedico esta canção do Carlos a alguém que muito gosto de visitar, o mar.)

Faltou o gordo a jogar a ponta-de-lança!

Tem de se acabar com essa regra das equipas visitantes terem que vestir o equipamento alternativo. Pois se a equipa tem este tipo de patrocinadores, devía vestir sempre o vermelho, vivo e cheio de golos. Que raio, o Manchester bem que podia vestir-se de outra cor... Para a próxima, pomos a renas a jogar, isso é que vai ser correr pelo campo fora...

segunda-feira, dezembro 04, 2006

Polaroides














O mesmo olhar envolvido de tantas e tantas memórias. A minha segunda cidade, envolta pelo mesmo nevoeiro que tantas e tantas vezes me acompanha de manhã, a centenas de quilómetros das margens daquele rio tão grande, mas tão grande que atravessa o meu coração de um lado ao outro. De um lado, aqueles socalcos que tanto frio, dores nas costas, mãos gretadas me deram ao longo da minha juventude, mas que ao mesmo tempo me deram manhãs inesquecíveis, tardes turvas de chuva e noites repletas de estrelas tantas que parecia que nunca as iria contar todas. Naqueles socalcos nasce o tempero dos meus dias, o sangue que escorre para dentro do meu copo. Lá no alto das Laceiras, o tempo passava mais devagar e as nuvens passavam tão baixo que quase as podia tocar. E eram brancas, tão brancas como aqueles cabelos desgrenhados que me ensinaram a ver o Sol através dos ramos das suas filhas, as suas filhas ancestrais. Do outro lado, a foz. Todos aqueles passeios pela marginal, uns de dia, ao som das ondas, outros de noite, com as luzes da cidade ao longe. As brincadeiras na areia fria, rodeados de nuvens e névoa, mas com a alma quente daqueles que me viram nascer. Ainda me lembro da mercearia, da gare dos eléctricos, da casa antiga de fundações mas jovem com a nossa presença e com a presença daquela jovem cujas rugas conhecia centrímetro por centrímetro. Quando pegava naquelas mãos, esquecia tudo o resto, o mundo era ali, naquelas mãos cheias de sabedoria. Tudo se passava na casa antiga. E depois surgiu a quinta fornada. E as visitas, apesar de mais espaçadas, eram sempre feitas de risos, alegria e a inocência que só as crianças verdadeiramente crianças possuem. E quando não tínhamos o rio ou o mar, bom, então a minha primeira cidade dava-nos os repuxos que saltavam das suas entranhas de mármore. E éramos felizes, na nossa despreocupada vida, vivendo os sítios e os momentos juntos como se fossem únicos. Obrigado, prima, pela tua objectiva que tantas e tão boas recordações me lembram vidas passadas.

Lá de Cima - XII


Sabang Beach, Mindoro, Filipinas

domingo, dezembro 03, 2006

Momento de claridade

Haverá coisa mais machista do que ter relações sexuais em pé, encostado a uma parede, meio tapados pelos cortinados, enquanto lá fora a chuva vai caindo abundantemente? Isto já para não falar de uma cena de masturbação feminina intercalada com imagens de um tipo a levar um balázio entre os olhos enquanto deixa uma linha de coca a meio...

(efeitos secundários de semi-assistir a um filme no Hollywood)

Liberdade de escolha?

A certa altura, o personagem Nick Naylor diz que nós temos de pensar por nós próprios e simplesmente não acreditar em tudo o que nos é posto à frente como verdade absoluta. E mesmo quando sabemos que a nicotina é a causa de morte de muitas pessoas por ano, não deve ser por essa razão que nos devemos tornar paternalistas com as pessoas e "fazer-lhes um desenho". Senão, qualquer dia, ainda dependemos de entidades falíveis como o Governo, seja ele qual for, para nos dizerem o que é bom e o que é mau para nós, deixando os nossos próprios cérebros mirrar. Afinal de contas, o poder de desligar a televisão, não ir ao MacDonald's, ir de táxi quando se tem uns copos a mais, ou deixar de fumar, está sempre nas nossas mãos, mesmo quando se trata de algo que nos causa dependência. Pelo menos, é essa a minha opinião e se calhar foi por isso que gostei deste filme.

sexta-feira, dezembro 01, 2006

Em memória daqueles cuja dor terminou


"The HIV/AIDS epidemic continues to grow. Some 40 million people, their families, and their communities, are now living with HIV. Effectively tackling this epidemic remains one of the world's most pressing public health challenges.

In August this year, at the XVI International AIDS Conference, 30 000 of us came together in Toronto in reply to the Conference's call to action. That action, we agreed, must reflect a balanced mix of prevention, treatment and care. This year's World AIDS Day theme "Accountability" reminds us again of our responsibility for making the right choices."

(Full text here)

quarta-feira, novembro 29, 2006

Rafael

Era uma vez um pequeno pinheiro chamado Rafael. Rafael viva numa dessas matas perdidas no interior do país, apenas atravessada por caminhos de terra batida. Convivia principalmente com os pequenos pardais e outros pássaros que aproveitavam os seus jovens ramos para fazerem os seus ninhos e criarem as suas famílias. Também à sua volta se passeavam alguns esquilos e de vez em quando vislumbrava um ou outro lobo perdido no seu caminho. E depois, muito raramente, também via aquelas estranhas criaturas que caminhavam em apenas duas patas, mas que não tinham asas como os seus vizinhos pássaros, apenas mais dois membros que apenas ficavam suspensos no ar, sem fazerem nada. Normalmente passavam a correr, vestidos de cores garridas e nunca se demoravam muito tempo naquela parte da floresta. E assim foi até um dia de Outono, em que aparecera uma estranha máquina, que fazia muito barulho e que afugentou todos os pássaros que se encontravam poisados nos seus ramos e nos dos seus irmãos pinheiros. De dentro dessa coisa, saiu uma dezena daquelas estranhas criaturas bípedes, muitas mais do que as que tinha visto em toda a sua vida. E ficou horrorizado ao ver que essas criaturas começavam a arrancar do seu leito terreno os seus irmãos pinheiros. Um após um iam sendo levados para dentro da máquina. E pela primeira vez na sua vida Rafael sentiu uma tristeza profunda que o sacudiu da ponta das suas raízes até ao mais alto dos seus ramos. Até que deu por si próprio a ser também arrancado da sua adorada floresta. Sentiu aqueles monstros a tirarem-no da sua terra, a colocarem-no no interior da máquina, juntamente com todos os outros pinheiros e teve um pressentimento que nunca mais veria aquela que tinha sido a sua casa até aquele momento. Perdeu os sentidos. Mergulhou na escuridão à medida que sentia a máquina mover-se. Quando se sentiu regressar à vida, Rafael apercebeu-se que estava dentro de terra novamente. Mas esta terra era esquisita, sentia as raízes apertadas, algo não estava bem. Estava, de facto, novamente na terra, mas apenas num pequeno pedaço dela. E estava rodeado de mais pinheiros, muitos mais pinheiros, mas todos eles pareciam tão desanimados como ele. Sentia uma luz muito forte mas não era o seu adorado Sol. Não, aquela luz não lhe aquecia os ramos como o seu amigo dos tempos da mata. Aquela luz era demasiado intensa e piscava ininterruptamente. Depois olhou ainda mais à sua volta e viu dezenas, centenas, provavelmente quase aos milhares dos mesmos monstros que o tinham arrancado da terra. E nesse momento sentiu uma enorme angústia, pois não podia fugir dali. As suas raízes não estavam equipadas para isso. Até que um dia duas das criaturas bípedes, acompanhadas de uma versão reduzida da sua espécie, se dirigiram a si, pegaram nele e levaram-no daquela espécie de casa, cheia de luzes artificiais, barulhos desconhecidos, e as constantes vozes das criaturas. Não demoraram muito a chegar a uma outra casa, mais pequena, mais sossegada, mais quente, enfim tudo o que a anterior não tinha sido. Mesmo assim, as saudades que Rafael sentia da sua floresta continuavam a aumentar de dia para dia, nada atenuando o seu desgosto. Mas havia alguma coisa de diferente. Aquelas criaturas pareciam dar-lhe mais atenção do que todas as outras que se tinham cruzado com ele. Passaram muitas horas de volta dos seus ramos, a pendurarem bolas, estrelas, laços e envolveram-no também de muitas fitas, de brancos nevosos e vermelhos berrantes. E à volta do seu pequeno recipiente de terra colocaram muitas e muitas caixas, umas grandes outras mais pequenas, todas cobertas de cores várias e com laços e laçarotes. Até que chegou um dia em que a casa se encheu de mais gente, houve muita comida e bebida, muitas criaturinhas pequenas a correrem de lado para o outro e à sua volta, e já a noite ia longa quando todas as caixas e caixinhas que tinham sido a sua companhia naqueles dias foram desembrulhadas e abertas e de lá de dentro saíram muitas e muitas coisas, todas elas desconhecidas para Rafael. Quase que se tinha acostumado àquelas criaturas que o tinham rodeado durante todos os dias. Mas ansiava por um dia poder esticar as suas raízes para lá daquele pequenino pedacinho de terra que agora tinha, e poder estar novamente rodeado dos seus irmãos pinheiros, e ter mais uma vez a companhia do alegre chilrear dos seus amigos pássaros. E foi isso que pensou quando, numa noite, uma das criaturas que ali moravam pegou nele, arrancou-o da terra e saiu daquela casa que tinha sido sua durante algum tempo. Mas uma vez cá fora, não viu qualquer sinal da sua floresta ou de outra qualquer. A criatura deixou Rafael dentro de um contentor verde, sem terra, sem água, sozinho e abandonado. E à medida que sentia a ampulheta da sua vida a esgotar-se cada vez mais rapidamente, Rafael apenas teve tempo de ver a Lua, lá no alto, e ter um último momento de recordação da sua amada floresta, onde tinha passado os seus momentos de maior felicidade. Era tempo de dormir e sonhar com árvores de plástico, iguais a ele próprio...

sexta-feira, novembro 24, 2006

Paz e Amor


(Clicar na imagem)

"The intent is that the participants concentrate any thoughts during and after orgasm on peace. The combination of high- energy orgasmic energy combined with mindful intention may have a much greater effect than previous mass meditations and prayers.

The goal is to add so much concentrated and high-energy positive input into the energy field of the Earth that it will reduce the current dangerous levels of aggression and violence throughout the world."

quinta-feira, novembro 23, 2006

Dream a little dream

Ok, eu admito, sou completamente apanhadinho por uma história de amor. Mas não daquelas de encher pacote ou tarde de televisão de fim-de-semana. Não, eu gosto de histórias de amor que passem pelas mesmas dificuldade/realidades que vejo todos os dias, nos meus próprios relacionamentos e nos daqueles que me rodeiam. É certo que as histórias de amor de Michel Gondry têm sempre um elemento surreal à mistura, mas no seu âmago tratam sempre das angústias e obstáculos que colocamos a nós próprios e à nossa felicidade com outrém. Isso misturado com a imaginação quase infantil de Gondry cria momentos únicos de beleza que nos deixa um sorriso ou uma lágrima como recordação. Gael e Gainsbourg fazem um par gentil e credível, quer nos momentos de maior união, quer naqueles em que os sonhos/pesadelos se metem pelo meio e os afastam da sua construção da floresta no barco em busca do mer. Foi um sonho bonito que passou por mim ontem à noite. E aqui, ainda fiquei a saber o que é que os meus sonhos dizem de mim... Será?


quarta-feira, novembro 22, 2006

Mito Urbano

Os meus pais nunca me falaram no papão. Nunca me disseram que quando somos crianças temos monstros a viverem por baixo da nossa cama. Que no escuro há coisas que desconhecemos. Nunca me ameçaram com estas coisas caso eu me portasse mal. Talvez porque sempre gostei de comer a sopa e nunca me esquecia de fazer o TPC antes de ir para a rua jogar à bola com os amigos. Mas também nunca foram uns pais super-protectores. Deixaram-me sempre dar os meus pequenos pulos no desconhecido. Aprovavam o facto de às vezes passar mais horas a ler algo do que em vegetar em frente a um ecrãn de televisão. Reprovavam o que tinham de reprovar e quando eu saía de linha diziam-mo logo, sem rodriguinhos, sem paninhos quentes, sem bichos-papões, sem lérias. "Portaste-te mal. Isso não se faz. Não o tornas a fazer, estamos entendidos?". Eles sempre foram assim e podiam-no ser quando eu era criança, porque eu era de facto uma criança e eles eram os pais. Mas os meus pais esqueceram-se de me dizer que os papões existem mesmo, especialmente quando entramos na idade adulta. Eles atravessam-se no nosso caminho, no dia-a-dia insistem em fazer parte da nossa vida, mesmo quando não os queremos. Estes papões insistem em fazer-nos crer que apenas eles têm a razão do seu lado, que nós somos uns inexperientes que apenas fazemos erros atrás de erros. Que eles, os papões, são o supra-sumo da sabedoria e o expoente máximo do medo que ensombra as nossas vidas. Que fazem tudo para que acreditemos que eles são mesmo a coisa mais aterrorizante à face da terra. Mas e eu, que nem sequer sabia da existência destes seres malignos? Como é que eu fico? Bom, acho que o truque é, como diria a sensual Miss Shirley, continuar a respirar, enfrentar estas aberrações de frente e não deixar que elas se achem no direito de nos intimidarem. E provavelmente, se assim o fizermos, o mais certo é que esse papão nos vire as costas, resmungando para com os seus botões e que volte para debaixo do calhau de onde saiu... Obrigado, mãe. Obrigado, pai.

Natal Seguro

E eis que numa bela manhã de Novembro, a principal artéria da minha bela localidade fica enfeitada com umas bonitas bóias de salvamento. Será que também vamos ter o Mitch no jipe, a subir e a descer a avenida? Isso é que era um Natal inesquecível...

 

(Fotos em breve)

 

segunda-feira, novembro 20, 2006

Dormente

adjectivo 2 géneros


1.
que dorme; adormecido;

2.
entorpecido;

3.
estagnado;

4.
fixo; quieto;

5.
sereno;

6.
BOTÂNICA diz-se das folhas vegetais que se enrolam de noite;


substantivo masculino


1.
peça fixa de marcenaria ou de serralharia;

2.
peça da atafona (instrumento de moagem de grãos);

3.
trave em que assenta o soalho;

4.
(via-férrea ) cada uma das travessas em que assentam os carris;

(Do lat. dormiente-, part. pres. de dormíre, «dormir»)


© Copyright 2003-2006, Porto Editora.

domingo, novembro 19, 2006

Os meus doze aromas

O cheiro das ondas salgadas a chocarem contra as rochas.
O cheiro de uma torrada acabada de fazer.
O cheiro do perfume francês da minha avó.
O cheiro das uvas na adega do meu avô.
O cheiro dos eucaliptos nas matas ao pé do Guincho.
O cheiro da mercearia da D. Luisa.
O cheiro do incenso na missa do galo em Valdigem.
O cheiro do bacalhau à brás da minha mãe.
O cheiro da lenha a arder na lareira na casa dos meus avós paternos.
O cheiro de um Montecristo fumado em boa companhia.
O cheiro de uma garrafa de vinho do Porto acabada de abrir.
O cheiro dos cabelos dela...

Se ao menos o Blogger me permitisse colocar todos estes cheiros aqui, não tinha havido necessidade de os enumerar a todos de uma forma atabalhoada...

"He had the power in his hand. A power greater than the power of money, terror or death; the undisputable power of inspiring love in human beings."

sexta-feira, novembro 17, 2006

Questões pessoais


My blog is worth $14,113.50.
How much is your blog worth?



Já que fui privado do meu direito a ser excêntrico, posso sempre vender o Espaço Cinzento...

Adenda

Provavelmente, o escrito anterior foi motivado por mais uma vez apenas ter ganho prémio no Eurocêntimos...

Renez-va-plius et faitez vós jeuz...

Serviço de utilidade pública - XII

Sempre sonhei ter umas orelhas como as do Yoda ou, mais refinadas, como as do Mr. Spock. Aquelas orelhas pontiagudas sempre me impressionaram e sempre ficaram na minha mente como o derradeiro sinal da enorme inteligência e postura zen daquelas personagens. O meu QI sempre ansiou por aquelas orelhas, sempre precisou de um símbolo, nem que fosse só para dar nas vistas. E o nariz? Desde que li o Gogól que tenho pesadelos com a fuga do meu nariz. Solução? Ter um nariz demasiado grande para que não possa fugir, uma coisa assim à Depardieu. Todos sabem que o raio do francês só é bom actor por causa daquela penca descomunal no meio da cara. As senhoras não resistem aquele nariz francês! E um transplante capilar? Quem me conhece sabe que herdei os sacanas dos genes cálvicos do meu velhote, de modo que não há-de demorar muito a sentir uma enorme corrente de ar no cimo do meu deformado organismo. O meu desejo era mesmo ter uma enorme carapa, ao melhor estilo hendrixiano. Enorme. Pelo menos com meio metro de altura. Algo assim como a Marge, mas sem ser azul (dá muito nas vistas). Os lábios não os queria maiores, pelo contrário, fininhos, quase inexistentes. Podia enxertá-los e oferecer o remanescente à Angelina (ouvi dizer que ela acha os dela ainda pequenos). Ah, e é claro que nenhuma remodelação plástica ficaria completa sem uma bela lipo-aspiração. Que bom seria aspirarem-me aquele excesso de banha que se passeia por este corpo tão longe da perfeição. E depois ainda ia pedir ao cirurgião que me guardasse toda aquela banha líquida num grande recipiente, para poder oferecê-la como prenda de Natal a uma pessoa por quem nutro muito carinho. Uma verdadeira prenda gordurosa, quase luzidia. O ideal para a minha mula, perdão, amiga. E depois... Seria a felicidade! Toda a minha vida iria tomar um rumo diferente. Finalmente ia conseguir ter muitos amigos e amigas (coloridos e descoloridos), o dinheiro jorraria aos montes, seria convidados para altos cargos... Isso sim, seria a vida que me estava destinada desde o início...

E o melhor de tudo, com grande audiências. Obrigado, TVI, por mais um momento gratuito de desgraça humana. Bem hajas! "Com um sorriso nos lábios e uma mensagem de esperança."

quarta-feira, novembro 15, 2006

Remédio Santo

If Man is 5...
If Man is 5
If Man is 5
Then the Devil is 6
Then the Devil is 6
Then the Devil is 6
And if the Devil is 6
Then God is 7
Then God is 7
Then God is 7

Primeiro passo para a doença mental. Ou pelo menos algo aproximado.
E hoje não escrevo mais nada. Está a chover.

terça-feira, novembro 14, 2006

Como tornar-se doente mental

"Se o leitor quiser ser fóbico, existe uma palavra que tem de retirar do seu dicionário: medo. Você está com as pernas a tremer, o peito afogueado, o coração a bater insuportavelmente, os pêlos eriçados, desfaz-se em suores frios, tem os olhos arregalados, mas não tem medo. Tem antes uma fobia, um ataque de pânico (passe o estúpido nome que os psiquiatras lhe deram), uma crise nervosa, mas medo, nunca.

[...]

Em tudo o resto você pode continuar a arriscar, mas uma boa parte das suas possibilidades vitais fica definitivamente arredada do horizonte. Tanto assim é que nem pensa muito nisso, a não ser que um percalço ou a insistência de um amigo ignorante dos seus tabus o leve a encontros inesperados. Esgotadas as suas evasivas, aí está o "inimigo", à frente dos seus olhos. Trata-se, para o comum dos mortais, de uma coisa banal, uma ridicularia que qualquer um vence sem problemas. Para si é uma coisa sagrada, que teme mas simultaneamente o fascina, como se fosse uma fronteira franqueável da sua vida. Repulsa e desejo, diria um psicólogo; porém, para si, continua a ser um problema topográfico, uma fronteira. Uma fronteira que talvez pudesse ultrapassar. Cuidado, porém, porque, se o fizer, não sei onde irá parar. Conheci um homem que, vencido o medo dos ratos, se tornou pegador de toiros."

Lugar da Estrada

Por vezes as palavram apenas atrapalham. Complicam. Minimizam. Descontextualizam. Um olhar ou um gesto podem dizer quase tanto ou mais. O silêncio também pode ser visto como uma virtude, especialmente quando não sabemos concretamente como verbalizar aquilo que realmente sentimos. Poderá ser uma inépcia mas por vezes é mesmo assim que me sinto. E é provavelmente por essa razão que gosto tanto das fotografias que vou tirando por aí. Não que sejam um portento de técnica ou de beleza mas simplesmente porque são um prolongamento do meu próprio olhar e que normalmente têm uma vida temporal que até a mim me surpreende. Por isso e por tudo aquilo que escrevi nas linhas acima, é que me posso deixar de palavras confusas e deixar só uma fotografia.

domingo, novembro 12, 2006

Gondry = Cientista de Sonhos


"Will you marry me when you are seventy and have nothing to lose?"

Para quem não conhece o trabalho de Michel Gondry, fica aqui um sonho do qual já disfrutei muitas vezes e nunca me canso. E agora é só esperar pela estreia de mais este sonho. Ah, e já agora, aqui ao lado, no Gira-Discos, fica um sonho mais pequenino mas que não deixa de ser um sonho bem bonito feito por este grande "cientista".

quinta-feira, novembro 09, 2006

Serviço de utilidade pública - XI


(Via Canochinha, a quem deixo uma vénia; originalmente aqui)

Sóbrio

Desde que me lembrava que aqueles jantares de empresa eram sempre assim. A desculpa costumava estar relacionada com o libertar da tensão acumulada de meses e meses de árduo trabalho e acabava por ser uma forma de melhorar o espírito de equipa e os laços entre todos os trabalhadores da empresa. Nobre propósitos, é certo, mas o que é que acabava por acontecer, ano após ano? Demasiadas bebidas alcoólicas à borla. A maior parte das pessoas deixava-se levar nas ondas enebriantes do que quer que contivesse uma pontinha de alcoól. Até podiam estar levemente envergonhadas no início e irem pedido garrafinhas de água, mas quando se chegava à sobremesa poucas pessoas sóbrias ainda restavam. Eu? Apesar de constatar todos estes factos em todos os anos que passei naquela empresa, não era nenhuma nobre excepção e também eu me deixava perder por entre copos de vinho tinto e whiskies escandalosamente maus de tão novos que eram. Por isso, quando foi confirmado que naquele ano o jantar seria num restaurante brasileiro, e apesar da racionalidade pensar em "picanha", a primeira palavra que começou a aflorar nos lábios de cada um foi "caipirinha". Na verdade, o plural deveria ter sido utilizado logo desde o início. O jantar foi bom. Apesar de nesse ano ter havido um corropio de re-modelações, re-organizações, re-estruturações e mais não sei quantas res-qualquer coisa, e não haver muita disposição para sequer pensar em trabalho, o jantar correu muito bem, apesar de agora não me lembrar que vinho fantástico era aquele que tinha bebido. O pior foi quando começou a música, naturalmente acompanhada da infame bebida brasileira que acaba em diminuitivo, como se isso desvalorizasse o conteúdo alcoólico. Foram muitas, demasiadas. As inibições começaram a cair por terra. Antigos desejos reprimidos surgiram à superfície. Eu tentei manter-me num canto, despercebido, mas não o consegui. Quando dei por mim já me encontrava também a dançar, ou melhor, a rodopiar no meio de tantas pessoas que eram do meu quotidiano mas que ali me pareciam perfeitos desconhecidos. Já a entrar na madrugada houve quem sugerisse ir a um bar que ficava ali perto. Felizmente era perto, podíamos andar um pouco, talvez assim a sobriedade nos pudesse cobrir um pouco a todos. Sol de pouca dura. Assim que entrámos no bar alguém me passou um whisky para a mão. Tanto quanto me lembro foi o primeiro de muitos mas naquela noite só me ficaria a recordação daquele único copo. Mais música, mais dança, mais bebida. O bar era todo ocupado por nós. E foi aí que a vi. Sónia? ou seria Paula? Lembrava-me vagamente que trabalhava nos recursos humanos, juntamente com as outras três raparigas que dançavam com ela. Os olhos dela estavam fixos em mim e, provavelmente, os meus estariam fixos nos dela. Andámos na direcção um do outro e, pelos passos desajeitados, estavamos ambos bêbados. Demasiadamente bêbados. O som da música não permitia grandes conversas mas, mesmo que o permitisse, não me parece que estivéssemos interessados nisso. Não depois daquele beijo intenso no qual tínhamos mergulhado. Tenho a ligeira impressão que não passaria pelas nossas cabeças tal acto, não fosse o nosso sangue estar tão inebriado ao ponto de fazer os nossos lábios juntarem-se daquela maneira. Ainda abraçados um ao outro, começamos a dançar, e a rodopiar no meio dos nossos colegas de trabalho. Todos de cabeça perdida, intoxicados no centro daquele ritual que se repetia todos os anos. Dançámos, bebemos e beijámo-nos uma outra vez. E de repente, quando as nossas pernas já se sentiam fartas de nos sustentar, acabámos os dois no chão, estendidos ao comprido no chão daquele bar. E pelo meio do alcool e de uma dor que nascia palpitante no meu tornozelo, apenas consegui pensar nela. No dia em que tínhamos casado. No dia em que beijei a mulher mais bonita do mundo. No dia em que jurámos que iríamos pertencer um ao outro até ao fim dos nossos dias. No dia mais feliz da minha vida. Senti-me asfixiar. Precisava de ar. Os meus colegas tinham-me devolvido à minha posição vertical e eu aproveitei para cambalear até à rua. As dores no tornozelo eram agora alucinantes. Assim que senti o ar frio da noite, senti-me mal disposto e logo de seguida dobrei-me encostado à parede e vomitei. Precisava de alguns minutos para me recompôr e por isso sentei-me no chão empedrado da rua. Só nessa altura reparei que nas ruas já se encontravam as decorações de Natal acesas. As luzes feriam-me os olhos mas eu não queria fechar os olhos. Sabia que se fechasse os olhos me iria lembrar que já não estava com ela. Que já não partilhava a sua cama nem o seu corpo junto ao meu. Iria lembrar-me que o meu amor por ela tinha passado de um fogo para uma leve chama, que mesmo assim ainda ardia, ainda que já separado dela. Sentia que a tristeza da separação começava a voltar a apoderar-se de mim. Tinham sido dois meses muito dificeis e muito longos. Não necessitava disso, não outra vez. Precisava mesmo era de uma bebida...

(Banda sonora e fonte de inspiração aqui)

quarta-feira, novembro 08, 2006

O Mal ao cimo da terra?

Vaticano pede anulação da marcha de Orgulho Gay em Jerusalém

(in Público)

Caro Bento XVI e demais membros do Estado do Vaticano, eu, enquanto crente na fé cristã (pelo menos desde a última vez que me vi ao espelho), não vejo os meus sentimentos feridos por um desfile de Orgulho Gay em Jerusalém ou, para esse caso, em Lisboa, no Cacém ou em qualquer outro lado. Também não me parece que, mesmo sendo Jerusalém uma cidade sagrada, um desfile deste género seja um grave afrontamento. Afrontamento serão, sem dúvida, os milhares de mortos que ao longo dos anos têm acontecido na faixa de terra à qual pertence Jerusalém, fazendo com que ambos os lados da barricada mantenham constantemente as suas mãos sujas de sangue inocente. Isso sim fere os meus sentimentos, não um desfile onde pessoas que se sentem marginalizadas nos seus direitos enquanto seres humanos, apenas e exclusivamente devido à sua orientação sexual, se manifestam por uma maior tolerância da parte dos "poderes altíssimos". Não, também não acho que deva haver limites à liberdade de expressão, especialmente não o deve haver se as expressões forem contrárias às nossas e forem feitas de uma forma pacifíca, como penso que estes desfiles o costumam ser. Em suma, acho que prestariam um melhor serviço à comunidade cristã se combatessem a pobreza que grassa nos países do terceiro mundo, ou a repressão causada por ditaduras que ainda perduram mesmo neste novo século, ou, simplesmente, que mandassem o idiota do W. calar-se cada vez que afirma que teve mais uma conversa com Deus e que por isso vai invadir mais um país que precisa de liberdade e, vejam lá, tem resmas de petróleo no seu subsolo. Mas não, parece ser preferível impedir uma marcha de homossexuais, como se o próprio Satã fosse estar presente. E depois ainda se questionam porque é que cada vez mais fiéis se afastam da Igreja.... Cresçam e apareçam, meus senhores. Eu também o fiz durante toda a minha vida...

terça-feira, novembro 07, 2006

Novidades Hertzianas

Descobri esta nova rádio por portas e travessas, nomeadamente blogueiras. A Química FM está a dar os primeiros passos na zona da Grande Lisboa, na frequência de 105.4 FM. E pelo que me foi dado a ouvir nos últimos dois dias, a coisa promete muito e bom, algo que começa a ser raro nos dias radiofónicos de hoje. E eles também prometem uma presença na Net, soon, very soon... E se quiserem ler mais sobre a Química FM e os seus programas, ficam aqui uma série de links.

1 Pouco Mouco

NetFM

Boa Noite e um Queijo

Otites

Triângulo Escaleno

Ex-Português Suave actual Padeira de Alcoitão

domingo, novembro 05, 2006

Cloud Atlas

"People are obscenities. Would rather be music than be a mass of tubes squeezing semi-solids around itself for a few decades before becoming so dribblesome it'll no longer function."

Ondas Sonoras - XX

Será que se eu escrever que este foi o primeiro disco que eu ouvi que me agarrou pelos colarinhos, abanou toda a minha massa cinzenta, para depois me apertar o coração com tamanha força que as lágrimas não pediram licença para correrem pela minha face abaixo, será que se eu escrever isto ainda preciso de escrever mais alguma coisa para vos explicar o que este disco significa para mim? A vida não é vida enquanto não se tiver ouvido músicas como Tyed, Whiskey & Water, City Sickness, Milky Teeth, Jism, Raindrops, Her, Drunk Tank ou The Not Knowing. Obrigado, meus senhores, por esta obra de arte que ainda hoje me assombra.

Dez

Uma completa falta de noção da realidade no que toca ao tempo disponível para ler e os livros que se vão amontoando em cima da secretária. Uma grande capacidade para ouvir todas as angústias dos meus amigos e uma igual enorme capacidade para escapar à partilha das minhas próprias angústias latentes. Uma necessidade premente de ter sempre o sol e/ou o mar perto de mim quando preciso de estar sozinho com os meus botões. Nunca me fartar de ouvir ou ler relatos de viagens aos mais escondidos recantos desta rocha flutuante a que chamamos Terra. Não conseguir estar mais do que cinco minutos chateado com alguém por quem realmente nutro sentimentos de amor ou amizade. Ter desenvolvido ao longo dos anos um ódio crescente a tudo o que seja gravatas, laços ou qualquer outro instrumento de tortura que se utilize à volta do pescoço. Demorar eternidades exasperantes quando se trata de alguma decisão daquelas que podem mudar o curso da minha vida (ok, houve Uma grande excepção). Uma tendência para chegar quase sempre a horas aos sítios, que normalmente choca de frente com a incapacidade da maior parte das pessoas chegar a essas mesmas horas. Não conseguir imaginar um dia sem ouvir uma música que me faça cantar para mim mesmo uns segundinhos. Chegar quase sempre cinco segundos atrasado a uma relação que podia ter durado o resto da minha vida.

Como diria o outro, prueva superada, não concordas?

quinta-feira, novembro 02, 2006

For you, my friend


(Seoul, South Korea, September 2000)

Because I feel like it...

It's been almost six years since we last saw each other. At that time we were left with almost half a world between us. Nowadays it's only one ocean but still it's a lot, right? I started remembering about the first day we met. Two strangers in a strange land. Only one thing in common, our faith. On that first day I remember a lot of things, Myoung-dong, Changdokkung Palace, Han River… You were taking your first steps on that massive city and I was actually being the host, who’d of think it? Our friendship grew with the days, and I still can hear a lot of echoes from our conversations. Our hopes, our expectations, our fears, our thoughts. And then there was the other side, the eating, the drinking, the dancing, and all those things seemingly unimportant but that brought our ties even closer. My (excruciatingly small) house was your house. Your welcoming point away from Chonan. I will never forget most of my weekends in the midst of those huge skyscrapers because most of the times you were there to share them with me. And soon after it was October. Going down to Kyoungju. Eating noodles somewhere around 2 a.m. Singing happy birthday in a bar where we were the only customers. Sleeping (and losing our minds) in a bus stop. Watching the sunrise in Pulguksa. Climbing Tohamsan. Trying to hitchhike in a place where even the natives don’t do it. Ending up tired and sleepy in yet another bar. Realizing it was a hell of a birthday. And then the last day came. You, me and all of my best friends from an unforgettable year went over to Pukhansan and saw the real Land of the Morning Calm. Since then it’s been mainly e-mail and messenger for us. You got married, I didn’t. You are happy, I’m happy for you. Because friendship can really climb mountains or cross oceans and, hey, someday we will make Portugal and Canada seem a little more closer, right? Take care, R.

“The world is a book and those who do not travel read only a page.”

St. Augustine

quarta-feira, novembro 01, 2006

A Perdida

Ele bateu com a porta, deixando-a só e na escuridão. Era ali o ponto final, ela sabia-o já, apesar de ele negar e dizer para si mesmo que não, era apenas um parentesis, uma forma de recuperar a sua sanidade mental. Ela era mais inteligente que isso, sabia que a partir daquele momento partido no tempo as coisas nunca poderiam regressar àquilo que tinham sido. O eco das palavras dele continuava suspenso no ar da sala. Palavras duras, despejadas com raiva, mas sinceras e certeiras. Por muito que lhe custasse, sabia que ele tinha razão, que por uma vez nos muitos anos que se conheciam era ele quem punha as emoções de lado e tentava puxá-la para o lado racional da questão. Mas para ela nunca poderia haver um lado racional ligado ao vendaval de tristeza que a assolava desde há seis meses àquela parte. Não, não, nunca poderia desligar o seu coração cada vez que pensava naquele trajecto de sofrimento que tinha durado quase dois anos, para depois terminar tão abruptamente como tinha aparecido. Tanto ela como ele tinham lutado muito por aquela vida, muitas lágrimas tinham derramado e muitas mais tinham escondido. Tinham-se apoiado um no outro, o seu amor permaneceu sempre inalterado ao longo de toda aquela provação, mas, reconhecia-o agora, tinha-se lentamente extinguido, não interessava de quem tinha sido a culpa, pura e simplesmente tinha-se apagado. Ele tinha conseguido prosseguir o seu caminho, ela tinha ficado perdida no meio do nada, confusa e sem perceber como é que era possivel continuar a viver, a respirar, a sorrir, a sentir um infímo de felicidade sem aquele que também era parte integrante dela. Por isso ela ficou ali, sozinha na escuridão da sala, agarrada a uma moldura, enquanto o amor da sua vida se afastava para sempre. Já não tinha mais lágrimas para gastar por ele, há muito que os seus olhos se tinham secado, tinha deixado de sentir qualquer espécie de sentimento quando a pessoa, cuja fotografia mantinha nas suas mãos, tinha expirado pela última vez na sua curta estadia neste mundo. Não, continuava a enganar-se desajeitadamente, pois sentia as lágrimas salgadas nos seus lábios, a tristeza já lhe era tão natural que quase parecia dormente ao facto de chorar compulsivamente. Não tinha forças para o agarrar, ele já tinha saído da casa deles, do coração dela. A angústia crescente começava a deixá-la à beira da loucura, tinha que fugir, deixar tudo para trás, desaparecer da vista de toda a gente, sentia-se a mais num mundo que já não tinha qualquer espécie de lógica para ela. Saiu para a rua. Sentiu o ar cortante da manhã que ainda não é manhã porque a estrela que nos aquece ainda não tinha surgido no horizonte.

segunda-feira, outubro 30, 2006

Infância perdida

"Mais uma greve no metro? Pois, não dão aumentos..."
"O quê, vou ter que começar a pagar portagem naquela estrada? Sempre a sacarem..."
"Hoje fui marcar consulta às 6 da manhã e mesmo assim não tive marcação..."
"Graças ao ministério da Educação, vou ter que dar aulas para trás do sol posto..."
"Aumento de 2 euros? Só podem estar a gozar..."
"É pá, tornei a não ganhar o Euromilhões. Sai sempre aos outros..."

A importância de tudo isto? Perguntem ao Mark.

"He last ate the day before. His broken wooden paddle was so heavy he could barely lift it. But he raptly followed each command from Kwadwo Takyi, the powerfully built 31-year-old in the back of the canoe who freely deals out beatings.

“I don’t like it here,” he whispered, out of Mr. Takyi’s earshot."

Lembrar, sempre lembrar


(Nova Iorque, Abril de 2005)

Mais um passo

Primeiro dia de trabalho depois de um período de férias mais que merecido.
Rever as caras do dia-a-dia, sorrir por ver a grande maioria.
Constatar que há poucas mudanças, o que é bom continua a ser bom, o que é mau permanece incessantemente mau. Contudo, foi um bom regresso.
Mas o melhor foi chegar a casa, ligar o computador, descarregar o mail e descobrir que por muito pequeno que seja o nosso esforço, acabamos de ajudar a dar mais um passo para algo que acredito sinceramente que possa contribuir para um mundo melhor.

"Depois de três semanas de campanha em Nova Iorque e mais de três anos de acções por todo o mundo, a Campanha Controlar as Armas obteve uma grande vitória a 26 de Outubro de 2006, quando 139 Governos votaram a favor da Resolução da ONU para o começo dos trabalhos sobre um Tratado Internacional de Comércio de Armas (ATT).

Não teríamos atingido este marco histórico sem o apoio de mais de um milhão de pessoas que se juntou à Campanha "Um Milhão de Rostos", os milhares de activistas creativos e dedicados que trabalharam na campanha e todos os membros e apoiantes que participaram e colaboraram com as nossas acções.

Ainda temos um longo caminho pela frente até o Tratado se tornar, efectivamente, uma realidade. Porém, este é um momento de celebração e recompensa pelo esforço e tempo dispendido por todos aqueles que contribuíram para esta vitória.

Deixamo-vos com os mais sinceros agradecimentos e esperamos que esta notícia seja, de algum modo, uma justificação do vosso apoio e trabalho para esta campanha."

Mais informações na Amnistia Internacional Portugal.

domingo, outubro 29, 2006

A Rejeitada

Saiu para a rua. Sentiu o ar cortante da manhã que ainda não é manhã porque a estrela que nos aquece ainda não tinha surgido no horizonte. Apertou contra si a camisola de lã que tinha recebido pelos anos, que a sua mãe tinha escolhido de propósito para ela. Não resultou, havia um pequeno sopro de ventania que ajudava o frio a penetrar os tecidos e que chegava até à sua pele. Decidiu fugir para dentro do carro. Entrou e pôs as mãos sobre o volante, quase numa súplica em busca de orientação. Não sabia para onde ir, só sabia que queria estar longe dali, num sítio onde ninguém se lembrasse de a procurar. Olhou para o espelho retrovisor. Ainda havia alguns vestígios de maquilhagem na sua face. Pequenos rios de tinta preta que atravessavam a sua cara. Por contraste, os seus olhos irradiavam vermelho, raios vermelhos de quem derramou demasiadas lágrimas. Pegou no lenço e tentou limpar os restos de maquilhagem que a desfiguravam. Arrancou. Já tinha destino. Já sabia para onde queria ir, onde queria estar. O carro deambulava pelas ruas, quase em piloto automático. Era muito cedo ainda para engarrafamentos, acidentes ou descontrolos psicológicos de pseudo-condutores, as ruas encontravam-se vazias à excepção do seu carro. Abriu um pouco o vidro. O vento fazia os seus cabelos dançarem de um lado para o outro, à medida que revia todos os acontecimentos na sua cabeça. Perguntava-se como tinha deixado as coisas chegarem aquele ponto, como podia ela ter continuado aquela farsa quando já sabia perfeitamente que tudo tinha chegado a um ponto sem retorno. Tinha-se enganado a ela própria. Ela, que sempre tinha sido o supra-sumo da objectividade, tinha-se deixado enredar nas próprias teias daquilo que condenava nos outros. A raiva fê-la pisar ainda mais o acelerador, quase perdendo o controlo do carro. Não, ainda não era a altura. O céu ainda agora principiava a clarear, mas a noite ainda não se tinha refugiado por completo. Não sabia bem o que sentir, se raiva, se tristeza, se desespero, ou se todas aquelas amostras de emoções não passavam de um camuflar do total estado de indiferença em que parecia estar envolvida. Ainda podia voltar atrás? Sim, era muito simples fazer meia-volta mas, ao mesmo tempo, algo lhe dizia que não, já era tarde demais, os dados já estavam lançados, na sua mente a decisão já estava tomada, "já estás conformada". Parou o carro. Tinha chegado. Tantas e tantas vezes tinha ali estado para ver o nascer do sol. De certa forma, aquele local era-lhe mais familiar do que todos os outros por onde tinha passado na sua vida. Ali tinha visto o nascer do sol com os seus pais. Ali tinha visto o nascer do sol com o seu primeiro namorado. Ali tinha visto o nascer do sol com o seu primeiro verdadeiro amor. Ali tinha visto o nascer do sol com o seu marido. Ali tinha visto o nascer do sol com o seu filho. Não mais veria o nascer do sol ali, naquele pedaço de terra cuja poeira sempre a acompanhou, agarrada a ela, quase a recordá-la que seria ali que tudo terminaria. Saiu do carro. O vento estava forte naquele dia. O sol começava a surgir no horizonte que ela sempre contemplara com um misto de curiosidade e temor. Apenas permitiu que uma única lágrima lhe corresse pela face. E depois começou a caminhar. E caminhou até não ter mais chão para caminhar...


Ritual

adjectivo 2 géneros




referente aos ritos;


substantivo masculino


1.
livro que consigna as cerimónias que se devem observar na prestação de um culto;

2.
conjunto de práticas consagradas pelo uso ou pelas normas e que devem ser observadas em determinadas ocasiões; cerimonial; etiqueta; protocolo;

(Do lat. rituále-, «id.»)


© Copyright 2003-2006, Porto Editora.

quarta-feira, outubro 25, 2006

Sondagem Cinzenta - VII


E acabei eu por ir apenas até aqui ao lado... Comparada com Madrid, a Patagónia parece apenas um sonho bonito... Ficará para outra altura... Valha-me ao menos a movida madrileña... Alguém dos que votou conseguiu concretizar esse destino? Acusem-se!

É bem verdade


terça-feira, outubro 24, 2006

De Besta a Bestial

Será que de repente tornou-se politicamente correcto não criticar o país onde vivemos? Justificar o mal-estar que grande parte da população sente com os sucessos alcançados de alguns? E logo num país onde a generalidade só se sente bem a falar mal de algo, e logo o nosso país que está ali à mão de semear, não podemos falar mal dele?

Concordo que se deve enaltecer o espírito empreendedor daqueles portugueses que conseguiram escrever histórias de sucesso. Também concordo que se fale das boas coisas que Portugal pode oferecer ao resto do mundo. Aliás, é esse o normal sentimento dos portugueses quando se encontram no estrangeiro, e porquê? Porque normalmente, por mais pequena que seja, encontram sempre alguma coisa no país de destino que não os satisfaz e que os faz lembrar de Portugal e de estar cá (comigo costuma ser quase sempre o café...). Mas, será que também devemos pôr umas palas nos olhos e fazer de conta que também não vemos as coisas que funcionam mal no nosso país, inclusivamente aquelas que até nem sequer nos afectam directamente? Devo ficar orgulhoso da modernidade do nosso país só porque vivo num centro urbano e acabei de saber que há mais um hospital de província que vai fechar, obrigando os utentes a deslocarem-se ao país vizinho? Não me parece coerente...

A realidade de Portugal, como em todos os países, tem sempre dois lados, aquele que nos deixa com uma pontinha de orgulho em ter nascido por estes lados, e o outro que normalmente nos deixa envergonhados ou zangados com o rumo que o país leva. Não nos deixarmos levar por patriotismos bacocos e fora de validade apenas porque se trata do nosso país parece-me ser essencial para o tornarmos melhor, principalmente naqueles aspectos que são fundamentais para qualquer ser humano, independentemente do ponto do planeta onde habitemos. Apenas da discussão de ideias pode surgir uma amostra de "bonança" e, para ser franco, preocupa-me quando há unanimidade em dizer que "Portugal é o maior" ou "Portugal é uma merda". Ambas são visões redutoras do que por este rectângulo se passa e por isso mesmo fico preocupado quando se coloca em causa a liberdade de expressão apenas porque estamos a comentar aquilo em que Portugal ainda deixa muito a desejar.

Portugal é o meu país. Não o escolhi mas sinto-me parte dele e onde quer que vá neste pedaço de rocha redondo levo um bocadinho do meu país no coração. Mas também vejo o que não gosto no meu país e não é porque também concordo que este país tem de se livrar do estigma pessimista que o assola que me vou calar perante as injustiças que ainda vão por aqui acontecendo. Era só o que me faltava!

sexta-feira, outubro 13, 2006

Ainda não é tarde para aprenderem!

Ao deparar-me com isto, fiquei a pensar nas escolhas que o sr. W. terá autorizado às suas forças armadas presentes em Guantanamo. Aliás, algumas das frases que aparecem neste "jogo", quase que consigo imaginá-las a sairem da boca de Rumsfeld ou de Cheney...

Peregrino

Passo a passo. O homem continuava a caminhar. Passo a passo. O Sol aquecia-lhe o corpo dentro do fato preto que tinha vestido naquele dia. A gravata parecia-lhe ainda mais apertada. O suor escorria-lhe pela testa abaixo, caindo, como se de lágrimas se tratassem, nas lentes dos óculos. Ele limpava-os à gravata mas sempre a andar. Não podia parar. Não podia distrair-se. Não podia desviar-se do seu caminho. Parecia que já caminhava há muitos dias, que no céu já tinham passado muitos sóis e muitas luas. Mas não, olhava para o alto, e lá estava o céu, azul como nunca o tinha visto. Apenas o disco faiscante do Sol traía o horizonte que se erguia sobre a sua cabeça. Limpou a testa com um lenço e notou que estava cada vez mais perto do seu destino. Acelerou o passo, mas sem correr. Não podia correr. Seria desespero a mais. A sua dignidade ficaria quebrada, partida em mil bocados. Mas, pensando bem, que lhe interessava a sua dignidade? Aliás, que outra coisa interessava que não fosse aquela para onde andava? Passo a passo. Estava mais perto. Já lhe distinguia ao longe as suas formas. Ansiava por ela. Quase voava, naqueles sapatos de camurça que pareciam gastos desde o primeiro dia em que os calçara. E o Sol que não parava de brilhar. E o suor que não parava de correr. E o seu destino que apesar de já ser visível continuava a ser quase uma miragem. Estugou o passo. De tal forma que quase tropeçou numa das pedras da calçada. Sentiu o desiquilíbrio e o seu coração bateu mais rápido. Não, não podia cair. Não agora que estava tão perto. Assim que recuperou a sua compostura, continuou a caminhada, agora mais atento ao chão que pisava que à imagem que buscava mesmo em frente. Passo a passo. Tinha chegado. Estava à sua frente. Respirou fundo e recuperou o seu fôlego. Os seus olhos ficaram enevoados, as lágrimas acumulando-se. Estava cansado mas feliz. Abraçou-a e ela beijou-o. Sabia que havia algo de diferente naquele beijo. Sentia-o. Mas não se preocupava com isso. Neste momento apenas queria sentir o corpo dela nos seus braços. Depois logo se veria. As coisas haviam de se resolver. Passo a passo. Tudo como dantes.


quinta-feira, outubro 12, 2006

Referendo precisa-se!


(Imagem via Coexist Reloaded)

Encruzilhada

substantivo feminino




ponto onde se cruzam vários caminhos;

(Part. pass. fem. subst. de encruzilhar)


© Copyright 2003-2006, Porto Editora.


Efeméride

É um dos meus melhores amigos, e por isso achei que era bonito deixar aqui para a posteridade o aniversário do seu refúgio suburbânico. Que a sua bússola continue a apontar para caminhos urgentes e que os seus escritos continuem a fazer parte da espuma dos meus dias. Um grande bem hajas e desejos de bons devaneios escritos para os teus novos "cúmplices".